Cristovão Tezza
Foto: Divulgação | Arte: Mirdad
"O país teima, década a década, em não sair do lugar – quando se move, é para trás. Cruzadas medievais de reforma agrária, o modelo de massacre de Canudos como eterna inspiração da justiça e da polícia brasileiras, o vale-esmola como ponta de lança da política social do país. Um espírito de mendicância abraça a alma nacional – todos, ricos e pobres, estendem a mão; alguns abanam o rabo"
"Os moderados diriam que progresso e natureza não são incompatíveis, mas é preciso alguma civilização entre uma coisa e outra, e no Brasil parece que não há tempo para nada, entre um projeto e outro há um mar de pessoas que vão sendo esmagadas pelo caminho"
"Os ricos no Brasil parecem perfeitamente corresponder ao imaginário coletivo que se criou em cinco séculos: na sua parte visível, é uma elite tosca, com frequência grotesca, de uma ignorância assustadora, renitentemente corrupta e corruptora e instalada capilarmente em todos os mecanismos de poder do país, que por sua vez se fundem na outra ponta com a bandidagem em estado puro"
"Nos dias de hoje, muito provavelmente teria sido metralhado pulando aquele portão antes mesmo que abrisse a boca, dramatiza ele; e as pessoas todas achariam isso justo e bom. O que ele fazia pulando o portão? Um ladrão a menos. Agora é o seu filho na balança: um a menos. A subtração é a regra"
"A língua portuguesa foi a única língua românica que aceitou a ordem papal de mudar os dias da semana, da nomenclatura pagã dos romanos para o seriado insosso da nossa vida: segunda-feira, terça-feira... Um povo obediente, capaz de trocar, por um simples decreto, o nome de seus próprios dias. E ele ali, carregando uma bandeira ridícula, o comunista acidental, como Chaplin virando a esquina"
"A rotina é uma máquina extraordinária de estabilidade e a condição básica de maturidade emocional e social"
"O futebol, uma instituição de importância quase superior à da ONU e que ao mesmo tempo congrega em sua cartolagem universal algumas das figuras mais corruptas e vorazes do mundo inteiro, um esporte que onde quer que se estabeleça é sinônimo de falcatrua, transformado num negócio gigantesco e tentacular, a mais poderosa máquina de rodar dinheiro e ocupar o tempo jamais inventada"
Trechos extraídos do romance "O filho eterno" (Record, 2007), de Cristovão Tezza.
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