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Mostrando postagens de janeiro, 2023

As crônicas de Clarice Lispector

Clarice Lispector por Claudia Andujar (acervo IMS) Eu amo as crônicas de Clarice Lispector . É o seu estilo que mais admiro, e “ A descoberta do mundo ” é o livro mais amado, o que sempre releio e o que indicaria a alguém para começar a ler a maga. Considero-o o mais importante para a minha formação como leitor e escritor, a me influenciar vida afora. A pernambucarioca nascida Хая de passagem pela Ucrânia, sagitariana de 1920, mãe de dois filhos, esposa e ex de um diplomata sortudo, criada até a adolescência como uma nordestina do litoral, traz o Atlântico em muitos dos seus textos, romances, contos ou crônicas, marcada pela maresia. Ô, mulher bonita! Até quando feia, era bonita. E a centenária é um feito único na literatura brasileira. Por fim, assumo: o melhor da maga são as crônicas! Seguem abaixo, uma coleção dos seus melhores momentos. Clarice eterna! “Para não esquecer” (1978) “Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe” Leia trechos aqui “A descoberta do mundo” (1984) “O inalca

Oito poemas de Ferreira Gullar no livro A luta corporal

Ferreira Gullar em julho de 1950 5 Ferreira Gullar Prometi‑me possuí‑la muito embora ela me redimisse ou me cegasse. Busquei‑a nas catástrofes, da aurora, e na fonte e no muro onde sua face, entre a alucinação e a paz sonora da água e do musgo, solitária nasce. Mas sempre que me acerco vai‑se embora como se me temesse ou me odiasse. Assim persigo‑a, lúcido e demente. Se por detrás da tarde transparente seus pés vislumbro, logo nos desvãos das nuvens fogem, luminosos e ágeis. Vocabulário e corpo — deuses frágeis — eu colho a ausência que me queima as mãos. -------- P.M.S.L. Ferreira Gullar Impossível é não odiar estas manhãs sem teto e as valsas que banalizam a morte. Tudo que fácil se dá quer negar-nos. Teme o ludíbrio das corolas. Na orquídea busca a orquídea que não é apenas o fátuo cintilar das pétalas: busca a móvel orquídea: ela caminha em si, é contínuo negar-se no seu fogo, seu arder é deslizar. Vê o céu. Mais que azul, ele é o nosso sucessivo morrer. Ácido céu. Tudo se retrai,

Dez passagens de Clarice Lispector no livro Outros escritos

“(...) Judith não seria mandada para a escola. E ninguém lê em latim sem ao menos saber as declinações. Às vezes, como tinha tanto desejo de aprender, pegava nos livros do irmão. Os pais intervinham: mandavam-na cerzir meias ou vigiar o assado. Não por maldade: adoravam-na e queriam que ela se tornasse uma verdadeira mulher. Chegou a época de casar. Ela não queria, sonhava com outros mundos. Apanhou do pai, viu as lágrimas da mãe. Em luta com tudo, mas com o mesmo ímpeto do irmão, arrumou uma trouxa e fugiu para Londres. Também Judith gostava de teatro. Parou na porta de um, disse que queria trabalhar com os artistas — foi uma risada geral, todos imaginaram logo outra coisa. Como poderia arranjar comida? Nem podia ficar andando pelas ruas. Alguém, um homem, teve pena dela. Em breve ela esperava um filho. Até que numa noite de inverno, ela se matou. ‘Quem’, diz Virginia Woolf, ‘poderá calcular o calor e a violência de um coração de poeta quando preso no corpo de uma mulher?’”          

Composições de Emmanuel Mirdad: I'm a Silent Bird

São tantos caminhos e possibilidades na vida, e você circula, a se aventurar no giramundo, acumulando as mais variadas experiências e sensações, alegrias e tristezas, êxitos e fracassos, até perceber que a estrada mais importante a ser percorrida é a feita em silêncio, para dentro de si, rumo ao magnífico encontro consigo mesmo. Esta é a mensagem de “ I’m a Silent Bird ”, o último single do álbum “ Silent Dreams ”, do cantor Jahgun , reggae star da Califórnia (que vai ser lançado em fevereiro). É um road reggae, alto astral, com uma pegada R&B e gospel, um cântico a ser curtido nas estradas da vida, e Jahgun impressiona com a sua voz cristalina, cheia de sentimento e emoção, ao gravar também, sozinho, o coral que faz de “ I’m a Silent Bird ” um clamor pelo autoconhecimento e a sensação de bem-estar consigo mesmo. “ I’m a Silent Bird ” foi gravada na Bahia e em Los Angeles, produzida por Emmanuel Mirdad (que também é o compositor da música) e Átila Santana (multi-instrumentista q

Dez passagens de Clarice Lispector no livro de crônicas Para não esquecer

“Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam mais bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.” “(...) acordei no meio da noite (...) ouvi aquela música de ar que uma vez antes já tinha ouvido. É extremamente do

Discografia Emmanuel Mirdad: Single “I'm a Silent Bird” (2023) — Jahgun

São tantos caminhos e possibilidades na vida, e você circula, a se aventurar no giramundo, acumulando as mais variadas experiências e sensações, alegrias e tristezas, êxitos e fracassos, até perceber que a estrada mais importante a ser percorrida é a feita em silêncio, para dentro de si, rumo ao magnífico encontro consigo mesmo. Esta é a mensagem de “ I’m a Silent Bird ”, o último single do álbum “ Silent Dreams ”, do cantor Jahgun , reggae star da Califórnia (que vai ser lançado em fevereiro). É um road reggae, alto astral, com uma pegada R&B e gospel, um cântico a ser curtido nas estradas da vida, e Jahgun impressiona com a sua voz cristalina, cheia de sentimento e emoção, ao gravar também, sozinho, o coral que faz de “ I’m a Silent Bird ” um clamor pelo autoconhecimento e a sensação de bem-estar consigo mesmo. “ I’m a Silent Bird ” foi gravada na Bahia e em Los Angeles, produzida por Emmanuel Mirdad (que também é o compositor da música) e Átila Santana (multi-instrumentista q

Dez passagens de Jorge Amado no romance Dona Flor e seus dois maridos

Jorge Amado escrevendo o romance Foto: Zélia Gattai           “— Meu bem, não diga isso... Você adora ser fiel e séria, eu sei. Mas isso se acabou, para que se enganar? Nem só comigo, nem só com ele, com nós dois, minha Flor enganadeira. Ele também é teu marido, tem tanto direito quanto eu. Um bom sujeito esse teu segundo, cada vez gosto mais dele... Aliás, quando cheguei, te avisei que a gente ia se dar bem, os três.           — Vadinho!           — O que é, meu bem?           — Você não se importa que eu te ponha chifres com Teodoro?           — Chifres? — passou a mão na testa lívida. — Não, não dá para nascer chifres. Eu e ele estamos empatados, meu bem, os dois temos direito, ambos casamos no padre e no juiz, não foi? Só que ele te gasta pouco, é um tolo. Nosso amor, meu bem, pode ser perjuro se quiseres, para ser ainda mais picante, mas é legal, e também o dele, com certidões e testemunhas, não é mesmo?           (...) não queiras que eu seja ao mesmo tempo Vadinho e Teodoro, poi