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Dez passagens de Jorge Amado no romance Jubiabá

Jorge Amado


          “O mar é a sua paixão mais velha. Já de cima do morro do Capa-Negro ele ficava a namorá-lo, estudando as variações do seu dorso que era azul, verde-claro e logo verde-escuro, tentado pela sua vastidão e pelo mistério que ele percebia existir nos grandes navios que descansavam no cais, nos pequenos saveiros que a maré balançava. O mar traz a seu coração um sossego que a cidade não lhe dá. No entanto, da cidade ele é o dono, e do mar ninguém é dono.
          Vem vê-lo à noite. Quase sempre vem só e se estende na areia alva do pequeno cais dos saveiros. Ali sonha e ali dorme o seu melhor sono de vagabundo. Certas vezes traz o grupo todo. E então é para o grande cais dos transatlânticos que se dirigem. Vão ver os homens que embarcam à noite, misteriosamente, levando sob o braço sobretudos e embrulhos; vão ver os homens que trabalham na descarga dos navios. (...) Ainda outras vezes Antônio Balduíno vai acompanhado mas não do grupo de moleques. É quando ele leva alguma pretinha da sua idade, ou pouco mais velha que ele, para dormir sem sonhar nas areias do cais do porto. Então não vai ver nem a paz dos saveiros nem o mistério dos transatlânticos e guindastes. Se dirige para cantos que somente ele e alguns negros conhecem, lugares de onde só a vastidão verde do mar é enxergada. Antônio Balduíno gosta que o mar veja as suas amantes e saiba que ele, apesar dos seus quinze anos, já é homem, já derruba uma cabrocha na areia, que é macia como um colchão. (...) Mas, sozinho ou acompanhado, ele olha sempre o mar como um caminho de casa.”


          “O homem fez Antônio Balduíno assoviar as músicas e tomou nota num papel cheio de risquinhos. Escreveu as letras:
          — Depois eu volto aqui para comprar mais...
          Desceu com a bengala arrastando. Os moradores do morro ficaram olhando. Antônio Balduíno se estendeu na porta da venda e botou as duas notas de dez mil-réis em cima da barriga nua. Ficou pensando no sapato novo que ia comprar e no corte de chita que levaria para Joana.
          O homem de bengala que adquirira os sambas disse de noite num café do centro da cidade:
          — Fiz dois sambas formidáveis...
          Cantou batendo os dedos na mesa. Os sambas depois apareceram em discos e foram cantados no rádio, tocados ao piano. Os jornais diziam: ‘O maior sucesso deste Carnaval foram os sambas do poeta Anísio Pereira, que são de enlouquecer’.
          Antônio Balduíno não lia jornais, não ouvia rádio, não tocava piano. Continuou a vender sambas ao poeta Anísio Pereira.”


          “— E não faz nada? Não aumenta estes homens? Concorda com esse crime?
          — Que crime, Lena? — o espanto de Ruiz não é fingido.
          — Que crime? — dona Helena vai de espanto em espanto. — Então você acha que não é um crime deixar esses homens, essas mulheres, essas crianças, Ruiz, crianças passarem fome...
          — Mas, minha filha, eu não digo nada. Desde o princípio do mundo que é assim... Sempre houve pobres e ricos...
          — Mas, Ruiz, são criancinhas passando fome... Você já pensou em Leninha passando fome? É horrível, meu Deus...
          Ruiz anda de um lado para o outro, agitado:
          — Para que você se mete nisso? Você não entende disso...
          — E você que é tão bom... Parecia...
          — Eu sou igual aos outros. Nem pior nem melhor.
          Há um silêncio no quarto. Ouvem a respiração forte da filha que vem do quarto vizinho. Ruiz explica:
          — Você sabe o que é que eles querem?
          — Querem tão pouco...
          — Mas é preciso não dar nada. Se a gente der hoje esse aumento, amanhã, quererão outro, depois mais outro, e um dia quererão as padarias...
          — Sei é que tem crianças com fome. E eles ganham mesmo uma miséria. Você nunca me falou que sabia destas coisas. E eu não sabia. Se eu soubesse...
          Ruiz se irrita:
          — Se soubesse o que é que fazia? Você lá sabe de nada. Eu estou defendendo o seu automóvel, a sua casa, o colégio de Leninha. Você acha que eu devo trabalhar para esses canalhas?
          — Mas eles querem tão pouco, Ruiz! Não é possível que você goste de ver o sofrimento alheio.
          — Eu não gosto de nada. Mas aqui não é questão de sentimentalismo. É coisa mais séria. Eu não sou eu, não tenho nada com meus sentimentos. Eu sou o patrão, tenho que defender meus interesses. Se a gente ceder o pé, amanhã eles quererão a mão... Você quer ficar sem automóvel, sem casa, sem criadas para Leninha? Eu estou defendendo isso tudo, estou defendendo o que é nosso, nosso dinheiro... Defendendo o seu conforto!
          (...)
          — Hei de sujeitá-los pela fome...
          Vem para junto da esposa e estende a mão para alisar os seus cabelos:
          — Não chore, Lena...
          Passa os braços em torno dela. Crianças estão esfomeadas nos becos.
          — Não se aproxime de mim... Você é um miserável... Não se aproxime...”


          “O imperador da cidade come nos melhores restaurantes, anda nos automóveis mais luxuosos, mora nos arranha-céus mais novos. E sem pagar nada. Depois do meio-dia vai com seu grupo a um restaurante e diz qualquer coisa a um garçom. Este bem sabe que não é negócio brigar com estes moleques. Dá as sobras de comida embrulhadas em jornais. Certas vezes até sobra comida que eles jogam nas latas de lixo. E velhos mendigos comem as sobras das sobras.
          Fica a esperar que passe o automóvel que lhe agrada. Porque o imperador da cidade não anda em autos vagabundos. Quando vê um bem luxuoso, ponga na traseira e viaja bairros inteiros. E se passa outro mais bonito, Antônio Balduíno despede o primeiro, monta no segundo e continua seu passeio pela cidade que conquistou.
          E ele e a sua guarda de honra só dormem nas portas dos mais novos arranha-céus, onde os empregados sabem que todos aqueles moleques têm navalhas, punhais, canivetes.
          Isso quando não preferem dormir no areal do cais do porto, olhando os navios enormes, as estrelas no céu, o verde mar misterioso.”


          “— Onde está o negro Antônio Balduíno que derrubava brancos?
          Aquilo Antônio Balduíno ouviu. Bebeu um gole da garrafa de cachaça que o Gordo lhe oferecia e virou para a assistência procurando o dono daquela voz. Voz que voltou metálica:
          — Quede o derrubador de brancos?
          Desta vez parte da multidão acompanhou o homenzinho e disse em coro:
          — Quede? Quede?
          Aquilo doeu em Balduíno como uma chibatada. Não sentia nenhum dos socos do branco mas sentia aquela censura dos seus torcedores. Disse ao Gordo:
          — Quando eu sair daqui dou uma surra neste sujeito. Marque ele...
          E quando soou o sinal de recomeçar a luta o preto se atirou em cima de Ergin. Pôs um soco na boca do alemão e em seguida um no ventre. A multidão reconhecia novamente seu campeão (...) o alemão voou para cima dele querendo acertar no outro olho de Balduíno. O negro livrou o corpo com um gesto rápido e, como a mola de uma máquina que houvesse partido, distendeu o braço bem por baixo do queixo de Ergin, o alemão. O campeão da Europa Central descreveu uma curva com o corpo e caiu com todo o peso.”


          “— Você se alembra, Antônio Balduíno, de Rozendo? Ele ficou doente mas teve a mãe dele que veio buscar ele. Foi até eu que descobri ela. E Felipe, o Belo, quando morreu teve também a mãe dele que veio pro enterro. Trouxe aquelas flores e veio muita mulher...
          — Tinha uma com cada coxão — atalhou Joaquim.
          — Todo mundo tem pai, tem mãe, tem uma pessoa. Eu não tenho ninguém.
          Atirou para um canto o cigarro, pediu outro copo de pinga:
          — De que vale a vida da gente? Você se alembra da vez que a gente apanhou como cachorro, na polícia? Pra que eles fez aquilo com a gente? A vida da gente não presta pra nada... A gente não tem ninguém...
          O Gordo tremia. Antônio Balduíno olhava para dentro do copo de cachaça. Viriato, o Anão, se levantou:
          — Estou chateando vocês... Mas eu fico só e fico matutando...
          — Já vai? — perguntou Joaquim.
          — Vou pegar a saída do cinema...
          Saiu se arrastando na bengala, curvo, coberto de farrapos.
          — Ele já se acostumou a andar assim — disse Joaquim.
          — Por que é que ele só conversa coisas tristes? — o Gordo não sabia, mas tinha pena porque era muito bom.
          — Ele sabe mais do que a gente — afirmou Antônio Balduíno.”


“(...) as águas do rio cobririam tudo, que o rio está cheio e chega a fazer ondas como se fosse o mar. Mas mestre Manuel não cede o leme a ninguém. O vento sacode as árvores nas margens. Muito ao longe brilha a lanterna de outro saveiro. Na escuridão dos matos os vaga-lumes piscam. O vento carrega o saveiro, que voa sobre as águas como uma lancha a gasolina. Neste momento, no meio do temporal, eles estão bem perto da morte. Um desvio do leme e eles se jogarão sobre as coroas de pedra, que estão invisíveis. Antônio Balduíno vai de papo para o ar, pensando estas coisas. No céu não vê nenhuma estrela, somente nuvens, negras e carregadas, correm açoitadas pelo vento. De Maria Clara vem este cheiro de maresia. E o mar está próximo. O saveiro está chegando na boca da barra. As margens do rio vão ficando para trás, os povoados dormem sem luz. Antônio Balduíno pensa que afinal a vida é besta, que não vale a pena viver. Viriato, o Anão, sabia destas coisas. E a estrada do mar é larga. Hoje é larga e revolta. O dorso verde do mar se agita. Também é um convite. Ele, negro valente e decidido, desde criança pensara em ter um abc que contasse aos outros negros a sua história, cheia de lances de coragem. Se ele fosse engolido agora pelas águas, não contariam a sua história. Um negro valente não se mata, a não ser para não se entregar à polícia. E um homem de vinte e seis anos ainda tem 
muito que viver, ainda tem que brigar muito para merecer um abc. Mas o mar é um convite. Ali está o caminho de casa. Vem de Maria Clara um cheiro de maresia. Ela fala no mar, conta casos acontecidos com mestres de saveiros, histórias de naufrágios e de mortes. Fala em seu pai que foi pescador e desapareceu numa jangada no meio de um temporal. Dela vem o cheiro do mar. Nela o mar está sempre presente, é amigo e inimigo, e já se incorporou nela. No negro Antônio Balduíno nada se incorporou. Já foi tudo e não é nada. Sabe que luta e que precisa lutar ainda mais. Porém, tudo isto aparece muito esfumaçadamente dentro dele. A sua luta é uma luta perdida. Ele o sente nos nervos que afrouxaram. Como se desse socos no ar. E agora o mar o chama, como na vinda o chamavam os lábios de Maria Clara. Mestre Manuel aponta. Ao fundo aparecem as luzes da Bahia. O vento voa em redor das suas cabeças. E traz todo o perfume de mar que está no corpo de Maria Clara. As luzes da Bahia faíscam como uma salvação.”


          “— Enquanto eu era bonita ele gostava de mim. Não havia presente que não me desse. Disse até que ia casar no padre e no juiz...
          — No padre e no juiz?
          — Sim, minha filha... Homem quando quer enganar é pior que o Sujo... Prometeu um mundão de coisas... Eu feito besta acreditei nele... Levamos por aí uma vida ordinária... Me encheu deste jeito...                 Tive que trabalhar e amarelei, perdi a cor, ele foi embora com uma cabrocha vagabunda que vivia abrindo os dentes pra ele...
          — Por que você não faz feitiço pra ele voltar?
          — Pra quê? Estou cumprindo o meu destino... O destino é Deus quem dá...
          — Pois olhe: eu se fosse você fazia feitiço pelo menos pra dar doença na bicha que levou seu homem... Então, vê lá... Uma mulher leva meu homem e fica assim... Igual a nada? Fica não, meu amor... Botava feitiço, dava lepra nela e ele voltava direitinho... E com pai Jubiabá que bota tão bem, feitiço tão forte...
          — Pra quê? Destino é coisa feita lá em cima — apontava para o céu. — A gente já vem com o seu para o mundo, tem de cumprir... Esse que está aqui dentro — mostrava a barriga enorme — já tem o dele prontinho...”


“(...) ele está com a atriz que conheceu num teatro e que se dependura no braço dele de uma maneira que roça os seios no seu peito. Agora vão cear num restaurante chique, de mulheres decotadas, onde bebem vinhos caros. Ele já beijou repetidas vezes a mulher que sem dúvida o ama, pois consente que ele lhe machuque os seios e suspenda por baixo da mesa o seu vestido de seda. Mas agora ela está novamente no quadro, com o leque em cima do sexo, porque o jirau está balançando muito e Antônio Balduíno se moveu na sua cama de tábuas, no outro lado da sala. Ricardo espera com raiva que tudo fique calmo de novo. Puxa a coberta esburacada até o queixo. Volta com a mulher ao restaurante para, logo depois, tomarem um automóvel e se deixarem ficar num quarto onde há cama e perfumes. Ele a despe devagarinho, gozando os seus encantos um a um. Pouco lhe importa agora que o jirau ranja e que Antônio Balduíno se mova. Não, não é a sua mão calosa que ele tem em cima do sexo. É o sexo alvo da atriz loira, que não está com vestido, nem com leque e que ama Ricardo, trabalhador das plantações de fumo. Acorde quem quiser, porque ele não está fazendo nada de mais, está amando uma mulher bonita, de seios duros e de ventre redondo. A sua mão é uma mulher.”


          “(...) o feiticeiro que vinha, a carapinha branca, o corpo curvo e seco, apoiado num bastão, andando devagarinho. Os homens paravam para cumprimentar:
          — Bom dia, pai Jubiabá...
          — Nosso senhor dê bom dia...
          Ia passando e abençoando. Até o espanhol da venda baixava a cabeça e recolhia a bênção. Os garotos desapareciam da rua quando viam o vulto centenário do feiticeiro. (...) Jubiabá trazia sempre um ramo de folhas que o vento balançava, e resmungava palavras em nagô. Vinha pela rua falando sozinho, abençoando, arrastando a calça velha de casimira em cima da qual o camisu bordado se oferecia ao capricho do vento como uma bandeira. Quando Jubiabá entrava para rezar a velha Luiza, Antônio Balduíno corria para a rua. Mas já sabia que a dor de cabeça da velha passaria.
          (...)
          Jubiabá passava encolhido pelos becos do morro, os homens o ouviam com respeito, recebia cumprimento de todos, e em sua porta paravam, de vez em quando, automóveis de luxo. Um dia um menino disse a Balduíno que Jubiabá virava lobisomem. Outro afirmou que ele tinha o diabo preso numa garrafa.
          (...)
          Jubiabá não veio à feira. Ainda é cedo para ele. Hoje é sábado e vai muita gente procurar o pai-de-santo. Gente que sofre. Uns, doentes que querem remédios para o corpo: feridas, tuberculose, lepra, moléstias da vida. Jubiabá vai distribuindo folhas e rezas. Outros vêm porque sofrem traição de mulher, ou porque desejam uma mulher que não dá ousadia, vêm em busca de feitiços fortes, de mandinga, de coisa-feita. No domingo as ruas amanhecem cheias de mandinga. Pai Jubiabá protege amores, acaba amores, arranca mulher da cabeça de homem, bota homem na cabeça de mulher. Sabe segredos de graúdos, sabe da vida dos pobres, o que é que ele não sabe na sua casinha do morro do Capa-Negro? Mais tarde ele virá arrimado ao bordão. Já curou gente, já acertou os negócios de muitas pessoas.”


Presentes no romance “Jubiabá” (Companhia das Letras, 2008), de Jorge Amado, páginas 75-76, 88, 314-315, 73-74, 13, 91, 238-239, 27, 164 e 21+241-242, respectivamente. 

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