Ontem eu tive a oportunidade de apresentar um pouco do meu trabalho (no caso, do livro Deserto Poema) na 9ª Bienal do Livro Bahia, mais especificamente, na Praça de Cordel e Poesia, ao lado dos poetas Wesley Correia e Sérgio Silva.
Não recebi orientação alguma do que fazer, e como não tinha ido ao evento até ontem, não fazia a menor idéia da sistemática da tal praça. Ontem à tarde, preparei uma ordem específica de apresentação dos poemas, e separei o que iria falar de mim e dos contextos que os tais poemas foram escritos. Aí, lá fui eu, ingênuo, achando que seria um bate-papo para gatos pingados interessados no assunto.
Nada disso. Na nossa frente, uma geral do Maracanã, de tudo que é idade, interesse e presença, e que no início de tudo, estava mais interessada em descansar nos "pufs" da praça. E eis que o colega Sérgio, jovem artista tarimbado nas ruas de Salvador, começa a sua eufórica apresentação de declamador teatral. Drummond. Fudeu. Que diabos estou fazendo ali, num calor desgraçado, sentado em um banco cenográfico, sentindo-me um pato de tiro ao alvo? Não sou declamador, não participo de recitais, não gosto de proliferar o que já foi dito. E o mais importante: não tenho poema algum decorado em minha memória de 1 terabyte. Nem faço questão. Porém, reconheço o valor de quem faz isso com tanta paixão e fervor, como o Sérgio fez. É importante que existam e sobrevivam figuras assim como ele.
O que fiz? Implodi meu roteiro. Então, tive que repensar rapidamente toda a minha apresentação. E comecei com Livrai-nos do Botox, Matusalém!, pedindo humildemente desculpas por apresentar meus poemetes. E assim baseei a exibição, contextualizando os versos, em voz forte, sem a teatralidade dos gestos. Acostumei-me com o trânsito das pessoas, dediquei poemas a amigos como Marla Barata e Rodrigo Minêu, e recitei o belíssimo Diálogo, de JIVM, o poema que mais me emocionou até hoje.
E tive sorte. O talentoso colega Wesley não embarcou nesse sistema de representação (pra mim, falho, mas que tem o seu valor que deve ser resguardado), e foi parceiro, apresentando seus belos poemas, contextualizando-os também. E esse gesto bom de louvor à produção salvou-me também.
No final de tudo, adorei a experiência, e senti-me um vitorioso, por ter tido a coragem e a rapidez de mudar tudo que tinha esquematizado, e de ter escolhido os poemas certos nas brechas que Castro Alves, Gregório de Matos e Drummond me deram. Obrigado, Wesley, e sua poesia é massa! Vou ler teu livro. E acho que algumas pessoas gostaram do que fiz. Devo ter tocado ao menos um.
Pra quem desconhece o belíssimo poema Diálogo, aqui vai:
O chocalho, no pescoço
da vaca, anuncia:
- Eu estou aqui!
O relógio, na parede
da cozinha, adverte:
- Não escaparás!
José Inácio Vieira de Melo
A Infância do Centauro (Escrituras - 2007)
.
Comentários
adorei pato de tiro ao alvo,rsrsrs. a verdade eu vou te falar, fico super nervoso cada vez que me convidam para estes eventos, suo morno, tenho taquicardia, sinto tremores, depois passa, fica mais confortável. não sei como José Inácio consegue memorizar tanta coisa, fico pensando em que momento ele faz isso. eu não consigo gravar nem meus poemas mais curtos. Sérgio e Edigar Vellame são atores, impossível competir com eles, mas acho que nossa atuação introspecta e mística sacudiu muita gente. fiquei pensando no lance do botox e na história da mulher que sofreu a perda de um grande amor. eu sou estas palavras. vê se me liga.
wesley correia
mto bom te ver, mesmo correndo.
me colocou no esparro né? =p
amei.
não vi Mineu lá. =[