Phil Moreno autografa no lançamento
do seu primeiro livro de poemas
em abril de 2019
Ato de amor
Phil Moreno
Quando estás em mim
no mais profundo do meu ser
te abraço com a minha alma
forte luz aparece sobre nós
pulsando vida
Te amo, te amo, te amo
Quando estás em mim
no mais profundo do meu eu
o céu se torna caverna
emitindo aos espaços
que nos rodeiam
uma chuva de estrelas
faíscas luminosas
sinfonia de murmúrios
Te amo, te amo, te amo
Quando estás em mim
no mais profundo do meu corpo
mistura líquida de lágrimas
secreções miraculosas
se fazem presentes
configurando, colorindo
gemidos
Te amo, te amo, te amo
Quando estás em mim
no mais profundo
busco tuas longas mãos
arrimo seguro
continente perfeito
Deslumbrada
descubro o prometido
sinto-me amada
e qual cabaça sem fendas
que só vibra enquanto inteira
ouço sinos e trombetas
silenciosos permanecemos
Te amo, te amo, te amo
Assim, esperamos,
ouvintes de nós mesmos
escutamos nessa silenciosa escuta
ecos de nós
Te amo, te amo, te amo
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Tempo
Phil Moreno
Nas tuas mãos
meu corpo
já não mais de vinte anos
exuberante, rijo
Nas tuas mãos
meus cabelos grisalhos
meu rosto envelhecido
Nas tuas mãos
meu cansaço
meus sentimentos divididos
Nas tuas mãos
meus olhos lúcidos
buscando no teu corpo
já não mais de vinte anos
o que almeja
o fulgor incansável
da minha alma menina
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Eus de mim
Phil Moreno
Não procures por mim
nas tuas certezas
estarei muito mais
visível para ti
Nas cores das nuvens
nas chuvas passageiras
no rufar das asas dos colibris
nas flores que caem no chão
Não procures por mim
nas tuas dúvidas
estarei sempre contigo
no silêncio
que estiver à tua volta
no ventinho que passar
por teus cabelos
Não procures por mim
nas tuas conclusões estabelecidas
estarei contigo
a cada amanhecer
Não procures por mim
no passado
nem no futuro
não marque certezas
estarei sempre junto
se vieres a mim
Não procures por mim
marcando certezas
não através de ti
não com tuas fantasias
com a tua saudade
Esqueças teus preconceitos
não estabeleças regras
venhas livre
Sou como as ondas do mar
quebrantes das praias
desertas
sou frágil como a gota do orvalho
forte e sincera
como é o gosto salgado
de uma lágrima
Não procures por mim
quando te sentires
seguro de ti mesmo
Estarei sempre perto
visível
na mais profunda
mansidão
à espera de que
um dia
possas vir
e que, ao chegar
ou lembrar,
possas permanecer
como só permanece
o novo
amanhecer
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Toques
Phil Moreno
Fale-me de amor
quando me tocas
sinto-me como árvore
rica de galhos, flores e frutos
Fale-me de amor
quando me tocas
meu corpo
canta hinos de glória
Fale-me de amor
quando me tocas
possuída de desejos
descubro-me como cachoeira
Fale-me de amor
quando estás presente
o tempo transcorre
sem parar
Fale-me de amor
quando me olhas
sinto-me como espaço matematizado
perspectivas novas aparecem
torno-me centro imaginário
dum todo
Fale-me de amor
quando me acaricias
meu corpo tonal
deixa de existir
o centro desaparece
Fale-me de amor
quando me abraças
sigo novas cadências
Fale-me de amor
quando me beijas
novas ordens aparecem
movimentos de forças chegam
Fale-me de amor!
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Continente
Phil Moreno
Na dimensão do teu gozo
o galopar estrondoso
do mais belo corcel
Na dimensão do teu gozo
o desabrochar dos campos cobertos
das mais diversas flores
Na dimensão do teu gozo
a natureza se dando inteira
à luz solar
Na dimensão do teu gozo
o tremor das asas gigantes do albatroz
iniciando o voo
Na dimensão do teu gozo
o pipocar dos fogos de artifício
iluminando os céus
anunciando festa
Na dimensão do teu gozo
teu pouso em meu continente
água fresca das nascentes das cachoeiras
farfalhar de vozes
silêncios e murmúrios
do momento antes desejado
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Nudez
Phil Moreno
Hoje, aqui estou
completamente desnuda
em teus braços,
para compreender
o que não pode
ser compreendido
revelado
a nós
neste agora
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Leque de bailarina
Phil Moreno
Venho de uma profunda
espera
trago comigo
segredos nunca revelados
caverna escura
silêncios de movimentos
contínuos
Venho das mais antigas estradas
caminhos secretos
cobertos de musgo
verdejantes florestas
onde a passarada
entoa os cantos
melodias que traduzem
os meus desejos
Venho trazendo
nas mãos pequenas
música e poesia
mãos que dizem
e acariciam
sem agonia
abrindo espaço
qual leque de bailarina
ao som da rija ventania
que traduz o que nos envolve
permitindo que em mim
a sua nau
afunde
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Toques
Phil Moreno
Amado
quando me tocas
sou rainha
sou mulher
sou pássaro que voa
flor que desabrocha
chuva fina que cai
sou claridade do amanhecer
sou canção de ninar
Amado
quando me tocas
sou ventania forte
ondas revoltas no mar
sou silenciosa
como são as asas das borboletas
sou frágil
como a gota do orvalho
sou plena
como é o arco-íris
Quando me tocas
reconheço o meu ser
sinto a beleza da minha alma
vibro com os segredos do meu eu
ao pé do teu ouvido
digo:
reconheço-me em ti
e, neste reconhecimento,
vou além de mim
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Oferta
Phil Moreno
Trago-te uma rosa
não a colhi nas roseiras
nos jardins ensolarados
nem nos prados
mais dourados
Não a roubei
não a peguei
nas mãos
dos enamorados
Não a comprei
na floricultura
não a encontrei
solitária no chão
de uma praça
nem num cortejo
fúnebre
Trago-te esta rosa
que não é uma flor
mas tem cheiro
tem formas
vibra
é viva
traduz o carinho
pulsão maior
do meu amor por ti
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Descoberta
Phil Moreno
Longe, muito longe
do meu corpo envelhecido,
escuto o chamado do amor
que em mim fizeste renascer
Longe, muito longe
do meu cansaço,
sinto em mim
desejos que pensei
que estivessem esquecidos
Longe, muito longe,
escuto o teu chamado
refaço caminhos percorridos
refaço vontades
que me levam
além de mim
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Laços
Phil Moreno
Brancos os nossos cabelos
transparentes os nossos desejos
navegar no azul dos teus anseios
foi transferir a inquietação dos mares
para as nebulosas galáxias do universo
que ora se permite desnudar
Brancos os nossos cabelos
não nuvens passageiras
cada fio, escrita do percurso vivenciado
onde cada um de nós
escreveu no tempo determinado
caminhos que não realizamos juntos
unicamente de nós para com os nossos
passado que não nos pertenceu
Brancos os nossos cabelos
transparentes os nossos anseios
não meras fantasias
céus e mares neles se fundiram
no mais profundo do acontecido
do agora
Brancos os nossos cabelos
navegantes de nós próprios
nos completamos para contemplarmos
os mistérios só nossos que permeiam
cada fio dos nossos cabelos brancos
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Comportas
Phil Moreno
Abram-se as cancelas
abram-se os portais antigos
abram-se as janelas
abram-se as cortinas
abram-se as comportas
abram-se as flores
abram-se as asas dos pássaros
Abra-se a madrugada
anunciando o dia
da chegada do parceiro
Campo aberto
corpo inteiro
aberto tal qual
comportas e cancelas
para recebê-lo
Ele vem
como janelas sem cortinas
sem flores, sem resistências,
portal antigo
a desvendar anseios
secretos desejos
Abram-se as cancelas
caminhos se tornem um
corpos unidos
inalem cheiros
naves que percorrem
céus e terras
desconhecidas
nós, descobertos, entrelaçados
num vai e vem contínuo
Abram-se as cancelas
os portais antigos
janelas e caminhos
Não me cubro de flores
vejo que se vai
silenciosamente
o parceiro
Fincando pés, abrindo asas,
refaço caminhos
descubro a razão
da nova espera
Não fechem as cancelas
os portais antigos
Sim!
Abram-se as cancelas
abram-se os portais antigos
janelas e caminhos!
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Moldura
Phil Moreno
Meus dedos fugidios
mergulharam
na brancura
dos teus cabelos
Meu corpo
campo aberto
mar revolto
burburinho
festa
Rufar de tambores
vozes de querubins
silvestres
ressonâncias
de instrumentos
fugidios
Teus cabelos brancos
revoltos
reverenciavam
a nossa nudez
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Saudade
Phil Moreno
No teu constante
ir e vir, permaneço
Quer esteja vestida
de roxo, vermelho ou azul,
o tom, o gosto
dirá sempre desta saudade
sem fim
Quando estás comigo
ornamentas meu ser
com os mais belos e requintados
beijos e adereços
Sem véus
trago nos cabelos
requintes dum trançado
que te dirá desta saudade
sem fim
Tuas longas mãos
se unem ritualmente
nas curvas sinuosas do meu corpo
assim coroada
busco-te
oferto a ti
o mais profundo
de mim
Entre risos e sorrisos
transformo-me em taça
do mais burilado cristal
Preenchida
lânguida como enguia
sigo o contorno
do teu corpo
alcanço o teu regaço
recebendo o teu abraço
esfumaço
na maior luminosidade
da manhã
e desta saudade
sem fim
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Silêncio
Phil Moreno
Só no silêncio
do teu abraço
me fiz senhora
No silêncio do teu abraço
refiz a minha história
me fiz maior
No silêncio dos teus braços
encontrei os sons
que traduziram tudo
que sempre quis ouvir
No silêncio do teu abraço
me perdi
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Ausência
Phil Moreno
Mordida
pelo reflexo diáfano
que em mim passou
Nexo de ilusões
crenças, anseios,
busquei o amplexo
dos teus braços
Para compor
como artista
numa pequena imagem
aquarela tênue
do sexo desejado
Desconexo acontecimento
perplexa me vi
num sorvedouro
Não foste ao encontro
A tua ausência
o teu silêncio
nos meus ouvidos
e, no quarto ao lado,
algum casal se ama
ao som de Roberto Carlos
Sozinha, na cama
o cheiro da murta
advindo do jardim
embaixo da janela
Desconexo momento
sem o amado
refiz o circunflexo
do vazio
da hora e do lugar
para compreender suas razões
no silêncio que se fez nesta hora
cheia de dúvidas
além do vivido
do experienciado
e poder dizer:
Vem!
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Premonição
Phil Moreno
Dentro, muito dentro
de mim,
nas ressonâncias,
algo soava assim:
diziam de uma espera sem fim
nas entranhas dos meus anseios
sempre te vi aparecer em mim
como cor sonora
escalas, melodias
nos mais variados ritmos
das batidas do meu coração
Nas entranhas dos meus devaneios
à busca d’um contínuo percebido
de audíveis melodias
diziam de ti
da tua presença em mim
no não-sonho
na angústia visceral
tornei-me
um compositor
um cantador do meu destino
refazimento de outras vidas
que insistiam em soar
em mim
na imaginação
A cada minuto vivido
sempre fui além de mim
criando espaços nunca possíveis
buscando, assim,
suprir esta presença tua em mim,
sentença que teria que cumprir
Muitas vezes, vislumbres de sonhos
permitiram teu corpo junto a mim,
corpo dum amado de outras vidas
soando qual tambor invisível
tirando das minhas entranhas
uma saudade sem fim!
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Construções desconstruídas
Phil Moreno
Que nem sonho de pobre
bati a minha laje
adentraste o meu barraco
fizeste a farra
no trocadilho dos ritmos
dos nossos quadris
refizemos a glória das avenidas
durante os carnavais
A enxurrada do outono
tudo mudou
a encosta deslizante
levou o barraco
Na lama, a dança
não mais nos pertencia,
os objetos, os ganhos adquiridos
nas grandes fanfarras,
no desejo delirante
juntos se iam
Sonho mau, pensei,
acordei
No sonho
enquanto tudo se ia
os pezinhos inertes
de um menino
apareceram
Percebi que
ao te perder
nada mais serei eu:
apenas os pezinhos
inertes
do menino
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Fuga
Phil Moreno
Levarei comigo
não lendas
e sim lembranças vivas
das tuas mãos
da tua letra
Nas tuas mãos
numa manhã
trazias a minha sentença
Lias em voz embargada
pela emoção
nomes nunca ouvidos por mim
diagnóstico de morte súbita
Lias não a tua
e sim a minha sentença
com frieza
Com calma
aquietei-me
como náufraga
no turbilhão
deste acontecido
Na veracidade da tua raiva
mágoas, frustrações,
constatei:
eras um desconhecido!
Levantei a cabeça
segurei a respiração
vislumbres do que fomos
se destruíam
na permanência
daquela hora
Eras um desconhecido!
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Despedida
Phil Moreno
Como se fora possível
sair da minha vida
sem se despedir
Levaste contigo
a minha ternura
deixando como óbolo
dúvidas das tuas resistências
tuas mazelas
dificuldades afetivas
Como se fora impossível
a minha sobrevivência
sobrevivi
tal qual trepadeira de jardim
na sombra do amurado
da minha varanda
busquei abrigo
Oferecendo-me por inteira
à luz solar
ao sereno da noite
o que de mim restou
Silenciosamente
mesmo sem a minha permissão
em meu rosto
um novo semblante
renasceu
Presentes no livro de poemas A espera que não tem fim (Paginae, 2019), páginas 83, 69, 15, 85, 133, 149, 141, 115, 161, 61, 29, 75, 55, 93, 165, 163, 21, 99, 177 e 179, respectivamente
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