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Cinco poemas e dez passagens de Lívia Natália no livro Em face dos últimos acontecimentos



Carta para Ela
Lívia Natália

Brasil, 22 de junho de 2022

“Você suportaria ficar mais um pouquinho”
com a barriga cheia disso
que te precipitou até esse lugar
onde essa pessoa te prendeu?

Aos 11 anos, uma barriga prenha dói
em mim, que pude escolher não parir.
Sinto esse seu ventre cariado,
onde alguém enfiou uma bíblia,
como se salvar essa coisa inóspita
pudesse fazer a sua vida valer mais.

Como alguém — uma juíza —
pode aprisionar sua morte
dentro de seu útero violado,
como um pássaro cujo voo
foi precipitado por um alçapão
perverso.

Esse seu útero, tão periclitante,
desde que o inominável burlou
tudo o que poderia te fazer
querer viver,
ainda é seu.

E talvez você nunca tenha nem pensado
que ele existia,
antes de o roubarem de você,
alienando nosso afeto todo,
menina,
e eu queria poder chorar por isso.

Mas, mesmo que todo o pranto que trago comigo
pudesse lavar seu corpo,
tudo continua perdido pra nós,
porque essa sua dor é irremediável,
e é ela que grita nas outras meninas
que este país cristão segue apedrejando,
por deus,
pela pátria
e pela família.

        *Em maio de 22, assim que se confirmou a gravidez de uma criança de 11 anos de idade, sua mãe a levou ao Conselho Tutelar de Tijucas, no Estado de Santa Catarina. Em junho de 2022, a equipe do Hospital da Universidade Federal de Santa Catarina negou-se a realizar o aborto, pois àquela altura ela estava com 22 semanas de gestação, o que contraria as normas técnicas do Ministério da Saúde, que recomenda o aborto, no máximo, até 21 semanas e seis dias, quando se trata de vítima de estupro. Assim, o hospital pediu autorização judicial para realizar o procedimento.
        (...)
        O aborto, em caso de estupro, risco de vida para a mãe ou o feto e em caso de anencefalia, é legal no Brasil há mais de 80 anos e é automaticamente autorizado pela justiça, devendo ser realizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Ao lhe negar esse direito — o direito ao aborto legal —, assim como aprisioná-la num abrigo a fim de “defender” a “vida” do feto, a magistrada alienou a criança de seu direito e pode ter provocado ou despertado um trauma terrível nela e em outras crianças e mulheres que passaram por violências similares.
        Eu, ainda menina, talvez numa idade muito próxima dessa criança, passei por uma tentativa de estupro por parte de uma pessoa da minha família. A maior parte dos abusos, notadamente os sexuais, é perpetrado por um familiar, muitas vezes residindo na mesma casa. No caso, era um primo de primeiro grau. Apesar de não entender muito bem o que estava acontecendo, eu me afastei dele rapidamente, me esgueirei pelo pé de carambola que minha tia criava na frente de casa e me joguei para o outro lado do muro, correndo para a casa de uma outra tia. Eu me salvei, mas poderia ser essa menina. Eu nunca contei publicamente essa história, e isso ainda me dói.

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PADÊ
Lívia Natália

        Todos os dias alguma coisa
        Tenta me matar.
        E falha.
        Lucille Clifton

Não é qualquer pessoa
que sabe ser o que somos:
Casca de ferida.

Destas que des)cobrem a dor
na meia contentação
de uma luta inteira.

Não é pra qualquer pessoa
não ser de brincadeira,
ser pau de dar em doido
e não poder enlouquecer.

Mais do que casca
somos a goela aberta da ferida
gritando silêncios ancestrais!
Somos veia aberta sangrando,
sagrada,
os nossos rios, nossas rotas rôtas
de dor negreira.

Somos algo que sangra e,
aguente,
porque vamos sangrar alto!
Se mais de 300 anos não mataram,
é porque a nossa raiz é profunda
todo preto é uma estrela suspensa,
somos feitos de um brilho
que mareia maré,
que se sabe lua,
que deambula imenso e se faz sol.

A gente sangra capoeira,
fazendo espiral na sua certeza.
A gente dança Alujá com pés de Oxê,
e no contrapé da dor,
fazemos cura.
E, de pé, ante nossa dor,
seremos cura.

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Em face dos últimos acontecimentos
Lívia Natália

29 de julho de 2019

Eu sei que não podemos nos calar,
mas há um tom a mais
que nos abafa o respiro.
Me encomendaram poemas sobre o que se passa,
e caminho pelas ruas açodadas
a me perguntar quando tudo isso
passa?

Os ombros do poeta sustentam o mundo,
mas quanto do mundo sobrará para amparar
os ombros fartos da poeta?

Não há palavras que se possa limpar e usar
para dizer do descompasso do tempo:
um tiro cravou-se fundo no peito —
no tempo em que um disparo bastava —
e lá estávamos, Chico Mendes, jazidos.
Índio Galdino, incendiados.
Candelária, entre a noite densa e a bainha da madrugada, destecidos.
Estávamos ônibus 174, no camburão justiceiro, asfixiados.

Hoje, uma bala no peito mal nos abre uma humilde vala.
Nosso algoz nos alveja 111, 80,
nos atinge Vila Moisés, Cabula, Carandiru
e caímos.

Marcha sobre nós com seus pés de comer cintilâncias
e não sobra uma estrela que diga
ainda haver poesia
nestes impossíveis dias.

(Disseram que chega um tempo em que não se diz mais: “meu Deus!”
Chegou o tempo em que podemos perguntar: há Deus?)

Nosso algoz nos tocaia em Marielles mil,
e miliciam a esperança que trazíamos no peito,
ele nos executa numa esquina
entre o medo
e a flama que carregávamos viva de desejo.

Há, no entanto, a força do sim.
E, como sempre,
sobrevivem, estilhaçadas,
sementes que nos prometem alguma primavera.

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111 tiros, 111 presos, 111 pretos
Lívia Natália

“Porque os presos são quase todos pretos.”
Trecho da canção Haiti, de Caetano Veloso e Gilberto Gil

Amanhã uma bala perdida atingirá meu peito.
Serei apenas outra negra perdida
ante a bala encontrada.
Da viatura, gritarão que transportávamos droga,
que atiramos com armamento pesado,
reagimos e tombamos
como do Dantesco tombadilho.
Sobre nossos corpos, as moscas e os urubus —
de casaca e microfone à boca —
enlouquecem dançando em espirais.
Que mais fazer deste corpo calado?
Deste golpe violento na cara?
Como sanar, na ferida, o sangue?
Há como calar com esta bebida amarga
tragando o paladar?

Reagimos, sim!
Desobedecemos:
uma mulher me confundiu com a empregada
me apontando o elevador,
eu a matei.
Meu irmão foi perseguido no mercado pelo segurança,
e suas mãos se demoraram sobre a carne branca,
até estilhaçar sua humanidade.

Os meninos que malinam na rua invadiram as casas e mataram
as sinha-
zinhas.

Não houve jeito.
Precisamos reagir.
Se a casa grande nos deve até a alma,
que comecem os jogos, que paguem com o que se paga:
E ei de escolher minhas peças pelos dentes.

* 111 foi o número de presos mortos no massacre do Carandiru, em 1992, após a Polícia Militar do Estado de São Paulo invadir o local para, na versão oficial, interromper uma rebelião. Toda a intervenção demorou apenas 30 minutos. (...) Em 28 de novembro de 2015, os jovens Wilton Esteves Domingos Júnior, Roberto de Souza Penha, Carlos Eduardo da Silva de Sousa, Wesley Castro Rodrigues e Cleiton Correa de Souza (todos com idades entre 16 e 25 anos) tinham ido ao Parque Madureira (RJ) comemorar o primeiro salário de Roberto. Eles estavam em um Palio branco, que recebeu 81 tiros de fuzil e 30 de revólver, totalizando 111 tiros desferidos; desses, 63 acertaram a lataria do carro e 30 tiros de fuzil e pistola atingiram os rapazes. Nenhum deles sobreviveu. (...) Segundo o laudo da perícia dos institutos Médico Legal (IML) e de Criminalística Carlos Éboli (ICCE), não foram detectados vestígio de pólvora nas mãos dos jovens mortos.

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Contando crianças mortas
Lívia Natália

Criança morta
por uma bala perdida

               — de fuzil,
nas costas:

Ágatha Félix, 8 anos,
Complexo do Alemão.

Criança de 12 anos de idade.
“entrou em confronto armado com a PM”.
Pequeno demais, mas suspeito,
mais um preto típico — suspeito — do Complexo do Alemão.

Efeito colateral:
12 anos,
Criança-dano
secundária na guerra do tráfico na Chatuba,
dizem que sentem muito,
                 jamais saberemos.

Troca de tiros,
bala perdida,
acidente,
enganos letais:

Jenifer Gomes, 11 anos, Triagem.
Outra criança de 11 anos, não identificada, Itaboraí
Mais uma criança não identificada, 11 anos, Jardim Catarina.
Criança não identificada, 10 anos, Galo Branco.
Ainda na barriga da mãe, em Costa Barros.
Criança não identificada, 3 anos, Magé.
Criança, idade desconhecida, Complexo da Maré.
Criança não identificada, 8 anos, Complexo do Alemão.
Mais uma, da mesma idade, em Maricá.
Criança não identificada, 6 anos, Complexo do Chapadão.

E seguimos arrastando cadáveres pequenos,
velando em caixão fechado
vidas devoradas,

por engano,

pelos dentes do fuzil.

Victor Almeida levou um tiro na cabeça,
aos 7 anos, em Marechal Hermes, onde morava.

Letícia Ferreira tinha 9 anos,
quando foi morta em Duque de Caxias.

Os pais queriam seus filhos
criados para o mundo,
mesmo na vida pequena,
nos apertados barracos,
havia a sombra bonita
um caminho, para eles, bordado.

Mas a Polícia os mata como moscas,
os pisam, baratas, no sem querer
dos coturnos bem lustrados.

Há uma guerra terrorista,
que nos costura a vida e
ninguém pede desculpas
porque somos, desde sempre,
o dano colateral deste País
e matar crianças negras é,
antes de tudo,
uma política de Estado.

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“A gente vive pra enganar o medo.”


“(...) Faz muitos anos que tenho sentido, como muitos que lerão este livro, que a minha vida está constantemente em risco, sendo eu uma mulher negra, intelectual dissidente, vinda de uma família de trabalhadores pobres da periferia de Salvador, na Bahia. Sinto-me continuamente exposta ao racismo, em todos os âmbitos da minha vida, seja aqui, na prática poética, quando as grandes editoras e os maiores círculos de feiras literárias preferem escritoras menos negras, seja nas salas de aula da universidade onde leciono, na qual, muitas vezes, sou pensada como um talento desperdiçado por me dedicar a estudar a Literatura Negra na área da Teoria da Literatura, seja no cotidiano da vida, onde sou sempre pensada como menor, insuficiente ou inadequada, quando não sexual, perigosa ou arrogante. Quantos estereótipos cabem sobre o corpo de uma mulher negra?”


“(...) 77% das vítimas de homicídio no Brasil são negras, assim, a chance de uma pessoa negra morrer é 2,6 vezes maior do que para uma não negra.”


“Sou forte. Sou brava.
Mas me dobro em entranhas miúdas
e meu sangue é cheio de esperas,
como as minhas lágrimas.

Sou forte como aquela flor
que verga sob o vento grave.

Sou aquela flor que verga
para guardar no pólen
o seu futuro perfume.”


“O Rio foi feito para se beber
                     — com o corpo”


“É preciso que mantenhamos a atenção e a nossa veia aguerrida, mesmo que o cenário mude nas próximas eleições, porque, como sabemos, há uma herança amaldiçoada, que é essa febre fascista, supremacista, aporofóbica, misógina, lgbtqia+fóbica, avessa à vida, à cultura e à educação que estes tempos brutos deixarão sobre nós. Lamentavelmente, existe uma legião de pessoas — muitas delas estudadas, ricas e bem-sucedidas — que defendem esse verde e amarelo síntese das práticas violentas citadas e lucram com as posturas do governo federal; esses são os perversos, que certamente seguirão em posições de poder e decisão e que continuarão colocando a vida e os direitos das minorias em risco. (...) preferi omitir os nomes dos nossos Algozes, porque a nossa emoção ou o nosso sofrimento não comovem os perversos. A nossa dor não move sua indignação nem seu cuidado.”


“(…) qual a diferença,
se dormir é um ausentar-se,
um estar fora da plateia
e estou sempre à deriva,
num mundo que me exaspera?

(...)

Tomo a outra pílula e o médico explica que é pra sanar a dor.
Não faz efeito, decerto,
tudo ainda é agudo e sem fim.
Os pedaços brancos de paz seguem me olhando.

Quero sorrir sem doer,
quantas devo tomar?”


“Preste atenção, por favor, ninguém pode manipular o seu corpo de maneira a deixá-la/o desconfortável. A sua privacidade deve ser sempre preservada. Ninguém pode mandar ou pedir para você tocar ou praticar qualquer ação no corpo desse alguém que lhe parece estranha ou errada. Ninguém pode manipular seu corpo sexualmente, lhe pedir ou enviar imagens do corpo despido, ou partes dele, por aplicativos de mensagem ou internet. E, finalmente, não existem segredos entre menores de idade e adultos quando a questão é o seu corpo e a sua sexualidade.”


“Sendo uma das pessoas cuja existência e subjetividade não estão previstas ou acolhidas no projeto de nação deste país, sinto que viver sob as várias violências cotidianas e ter de seguir lutando e resistindo é insalubre. (...) Sempre será um risco para mulheres negras, e para pessoas negras de maneira geral, neste país, que até 2020, a cada 23 minutos, matava um jovem negro; será perigoso para indígenas, para pessoas LGBTQIA+, para todos que contam como uma falha no projeto desta Nação. Somos um incômodo a ser contido desde a escravização e a dizimação das populações negras e indígenas no Brasil e em todos os países submetidos ao colonialismo. Finalmente, sinto que desde os meus dentes, minhas raízes, meus impossíveis mil avós, desde que o Brasil é Brasil, nossas vidas não importam.”


“O poema Quadrilha [Maria não amava João. Apenas idolatrava seus pés escuros. Quando João morreu, assassinado pela PM, Maria guardou todos os seus sapatos] nasceu do meu horror quando soube que, na madrugada de 17 de fevereiro de 2015, às vésperas do Carnaval de Salvador, uma companhia da Polícia Militar invadiu uma comunidade do bairro do Cabula (Salvador-BA), chamada Vila Moisés, onde cercou um grupo de jovens e executou sumariamente 12 deles. Do total de 18 jovens cercados, apenas seis conseguiram escapar, porque fingiram-se mortos. Naquela madrugada, os Policiais Militares dispararam 500 tiros, 88 deles atingiram os corpos dos 12 jovens mortos. (...) Como cidadã, não sou contra nenhum policial militar, enquanto indivíduo, e prossigo achando absurdo o crescente número de mortes de policiais em serviço. Isso não me impede, porém, de afirmar que a Polícia, enquanto braço armado do Estado, precisa repensar seus métodos de entrada nas comunidades pobres, a guerra às drogas e, principalmente, a formação de seus policiais. É urgente que essas pessoas, que, hoje, na Polícia Militar de Salvador, são majoritariamente pretas e pardas, possam lançar um olhar humanizado sobre a sociedade que eles têm como responsabilidade ‘Servir e Proteger’.”


Presentes no livro de poemas “Em face dos últimos acontecimentos” (Caramurê, 2022), de Lívia Natália, páginas 54-58, 61-62, 43-44, 38-39+41, 35-37, 33, 11-12, 13, 64, 67, 18-19, 47-48, 59, 17-18 e 24-25, respectivamente.

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