Bloco 01 (Chula e Brasil Real)
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Bloco 02 (Cultura Orgânica e Crítica da Voz de Xoxota)
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Bloco 03 (Amigos e Carreira)
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Bloco 04 (Política Canalha e Classe Média Miserável)
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Programa #09
Roberto Mendes
Santamarense.
Sagitariano, natural de Santo Amaro da Purificação, na Bahia, de novembro de 1952, Roberto Mendes é cantor, compositor, violonista e pesquisador dos ritmos legítimos do recôncavo baiano. Ex-professor de matemática, começou a carreira artística em 1972, no grupo Sangue e Raça, ao lado do parceiro Jorge Portugal e Raimundo Sodré. Desde 1983 que a conterrânea Maria Bethânia eterniza suas composições, além de outros artistas da música brasileira. A carreira solo começou em 1988, e desde então, lançou nove álbuns e um DVD.
Em parceria com o jornalista Waldomiro Júnior, com o apoio da Fundação Palmares, lançou em 2008 o livro Chula - Comportamento Traduzido em Canção, sobre a importância da música de raiz do recôncavo na formação da nacionalidade brasileira. E está previsto para 2009 o lançamento da série Sotaque em Pauta, com o seu primeiro volume Chula: O Canto do Recôncavo, que engloba um livro, CD e DVD, feito em parceria com Nizaldo Costa e as transcrições para partitura de Marcos Bezerra.
Roberto Mendes indica para ouvir Maria Bethânia, principalmente Brasileirinho (2003); ler os cadernos de cultura de qualquer jornal e suas críticas (pra ficar com raiva); assistir os canais Discovery Channel (em mute) e TV Senado (pra ficar com mais raiva ainda) tocando violão para não enfartar; e contemplar o silêncio, um passarinho, uma planta ou uma foto de Santo Amaro da Purificação.
“Eu sou um santoamarense apaixonado por sua terra, um provinciano plantado, uma pessoa simples que tenta tocar violão, fazer tudo que traduza, da melhor maneira, o comportamento do seu povo, da sua tribo. E eu almejo ser feliz em minha terra, poder um dia morrer onde nasci”.
“A chula é um comportamento que foi traduzido em canção. Isso acontece pela fusão de três elementos: a língua, com o canto em redondilhas maior e menor, lusitanas; a viola que veio da Ilha da Madeira, tanto a machete como a ¾; e a ritmia kabila harmonizada em viola pelos sudaneses no século XIX. A chula é um canto violado”.
“Eu gosto de falar mais da música sem razão, o barulho naturalmente organizado, que traduz o comportamento de uma tribo, uma nação, um povo que forçosamente teve que criar situações para poder se entender. Essa é a música que eu tento fazer. A desconstrução do cais no leito de um rio para devolver a compreensão da mata ciliar”.
“O Brasil Oficial vai entender que tem que resolver as questões do Brasil Real, porque senão ele vai ser tomado pelo Brasil Clandestino. E eles já estão muito próximos. Hoje a clandestinidade está no Congresso, na Justiça. Então, é um problema do Brasil Oficial, porque o Brasil Real continua o mesmo; cantando, comendo, vivendo perto da natureza, do vizinho”.
“Eu não tenho nada além do que preciso para viver feliz aqui. Por isso que costumo dizer que eu não sou brasileiro, sou santamarense. Não sofro a doença dos brasileiros. Aqui nós vivemos muito bem com muito pouco. Muito bem”.
“Não sou artista na minha terra, sou um prestador de contas. Como representante da tribo, tenho que voltar e dizer o que fiz lá fora. E eu não gosto de sair da minha cidade. Caetano, Gil, Bethânia, Gal Costa; pessoas que tiveram de sair para que eu ficasse. E o que garante a minha ida é a passagem de volta; é a única exigência que faço”.
“Eu acho um absurdo o mundo interferir na cultura alheia. E a arte é um conteúdo cultural refém da forma. A cultura não tem forma. Eu nunca vi dizer a um chuleiro não cantar porque tá rouco. Ele canta mesmo. Mas o artista cantor jamais vai cantar rouco, porque ele é refém do seu canto, definido e afinado pela escola. Quem nunca viu um chuleiro desafinar? Ele não sabe o que é afinação. Ele se afina dentro do comportamento, da idéia de se comunicar”.
“(Sobre a obra ‘Sotaque em Pauta - Chula: O Canto do Recôncavo’) Eu permiti que pudesse ser definido em pauta (partitura) essa forma que copiei do Tune, João do Boi, Clarindo, pra que outras pessoas tenham acesso a isso. Tenho muito medo de ter um problema e deixar isso só pra mim. E isso é de todos, não me pertence”.
“Acho impossível a razão entender o orgânico. A razão é contra o prazer, é tira gosto. Mas na música, a academia precisa tomar conta desses imbecis, mal-criados e mal-nascidos, que pensam que podem dar nome a tudo. E, de repente, tudo passa a ser genial”.
“O câncer da cultura nacional é a agência de publicidade. É uma desgraça, tenho horror, não posso ver uma que eu saio correndo. Porque inventam produto em tudo e achataram o Brasil com isso”.
“É a minha cara dizer que alguém não canta nada”.
“A função do crítico sempre é o equívoco. E a visão acadêmica de crítica é muito burra, porque eu não faço música pra razão; faço pra freqüência simpática, emoção, prazer da alma”.
“Eu queria informar ao (crítico musical) Mauro Ferreira que, pra cantar, basta se ter voz, falar. Só quem não canta é o morto. O problema de afinar ou não afinar é um condicionamento do ouvinte. Mas é válido, porque eu tô dando trabalho a Mauro Ferreira. Queria até que ele mandasse uma graninha, porque se eu não cantar, bem ou mal, ele não tem o que falar”.
“A Bahia é generosa. Em iorubá, Ba é pai, e Ia é mãe. E o ‘h’ é que fez o elo, o hífen, que promoveu o encontro dessa baía grande, baía com ‘h’. E a Bahia é de tudo, de todos”.
“Capinan é o médico poeta que cura a gente com a frase, e tem na palavra o seu orixá; Jorge Portugal é a causa de tornar a minha canção refém da poesia; Raimundo Sodré veio pra ser o nosso intérprete, mas deu um golpe na carreira ao ir morar na França, ficando despatriado; Lenine, sou fã - é a única pessoa do Brasil que consegue emprestar a essa coisa pop mundial o seu sotaque, sem agredi-lo”.
“Gravar com Maria Bethânia é a certeza da qualidade de meu trabalho. Eu sempre fiz música pra Santo Amaro e quem dá voz a isso é ela. Talvez seja por isso que as pessoas acham que eu não tenho voz pra cantar, porque Bethânia já me canta muito bem. Mas a tradução, em termo de fidelidade à tribo, ainda é minha”.
“Se Bethânia não fosse de Santo Amaro, eu não gravaria com ela. Não teria nenhum interesse. Mas ela é o estímulo maior da minha obra”.
“Não faço música pro mercado. Não tenho nenhum vínculo com ele. O único disco que pego na gravadora é o meu, pra ter em casa; mesmo assim, depois alguém toma, e eu esqueço que fiz. Meu trabalho termina na gravadora quando eu entrego o disco. Acabou, não faço mais nada. Não sou vendedor de disco. Eu faço música, pra agradar a mim”.
“A música é boa quando as pessoas escutam e se acham dentro dela. Por isso que a crítica, na maioria das vezes, é grosseira e estúpida, porque ela cria uma ditadura do gosto, como se ela pudesse dizer o que é bom e o que é ruim”.
“Eu sou a reprodução do meu equívoco”.
“Hoje a cultura política é a cultura da canalhice. Ser político no Brasil é ser canalha. Cada dia que passa é pior, virou norma. É impressionante como a bandidagem oficial tomou conta. O conceito de moral e ética tem que ser preservado à bala, é intocável, não se pode sofrer um arranhão. E eu tenho a obrigação de conhecer o prefeito da minha cidade. Tenho que saber quem é o vereador, onde mora. Porque a única coisa real que existe é o município. O Estado é uma ficção, e a Federação é uma ficção pior que o Estado”.
- Sobre a afirmação do escritor e roteirista Aurélio Schommer, no K7#08, de que ‘o homem não tem nenhuma razão para ser fiel, e uma mulher que passe a vida inteira sendo fiel não merece a fidelidade do marido’: “Eu sou fiel porque eu sou fiel a mim. Sou casado há 30 anos e nunca passou no meu ambiente essa discussão. E minha mulher nunca perguntou onde eu estava e o que tava fazendo; então, não tenho cultura de ser interrogado. Minha individualidade nunca foi agredida. E eu acho uma coisa grosseira ser fiscal de xibiu. Não tenho tempo pra isso. Eu faço música!”.
“Pela primeira vez no Brasil temos um presidente falando a língua do Brasil Real. Eu tenho adorado os discursos de Lula porque é um discurso sem medo de ser criticado. E é a primeira vez que vejo a possibilidade do Brasil Real junto ao Brasil Oficial. O elo está em Lula, mas a classe média não gosta não, tem vergonha”.
“A classe média no Brasil ainda arruma a casa para receber visita. Depois que a visita vai embora, o lixo continua. Eu nunca arrumei a casa pra isso. Nunca irei arrumar. Na minha casa, a visita come o que minha mulher e meus filhos comem. E a minha casa vai estar arrumada porque minha família mora nela. Por isso que eu nunca vou ser classe média”.
“Eu acredito muito na memória. É a base de sustentação para a evolução da alma humana”.
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Escute Roberto Mendes, com a música Saluba, em uma gravação exclusiva para o Podcast K7:
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Ficha Técnica Podcast K7 #09
Gravado em 28.06.2009, Santo Amaro da Purificação-Ba.
Direção, produção, entrevista, gravação, edição, montagem, vinhetas e locução: Emmanuel Mirdad.
Trilha sonora: EP Mirdad - Harmonogonia (2008).
Trilha das aberturas e vinhetas: Lost Mails, The Orange Poem - Psicodelia (2008).
Fotos: Mirdad.
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Comentários
HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!!!
Tudo bem que eu recortei o menos importante, parabéns pela entrevista!!!