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A jornada para escrever o romance oroboro baobá — Parte II (2014)


oroboro baobá” é o meu primeiro romance. Escrevê-lo foi um laboratório, um curso, um aprendizado. No post de hoje, a 2ª parte da jornada de criação do “oroboro baobá”, com o relato do que aconteceu em 2014: o autoral pulsando em alta; rever em vez de escrever e/ou rever como escrever; a premissa “filosófica” surge da canção “Musiquinha”; presentes de Mayrant Gallo; escrevendo no niver; 1ª troca do título; o romance vira conto; nova opção para a capa [outra tela de Nelson Magalhães Filho]; literatura em alta na minha vida; o personagem Bip-bip batiza Muralha; o conto “Muralha” ainda incompleto; e muito mais.


VIVA O AUTORAL!

Noite de terça, 14 de janeiro de 2014, decido mudar a minha vida: basta de business man! De 2008 a 2013, o foco havia sido a carreira de produtor cultural e empresário, a criar e a realizar projetos e eventos para divulgar e celebrar a arte de outras pessoas, e tentar enriquecer. Viro a chave: d’agora em diante, o foco é a minha carreira artística.

Desfaço a sociedade na empresa Mirdad — Gestão em Cultura e desisto de todos os projetos “externos” [como a Flisca e a Flican], mas continuo como sócio da empresa Cali e a gerenciar a Flica [única fonte de renda, não poderia largar].

A principal realização de 2014 se torna o fim digno para a banda The Orange Poem (2001-2007). Gravamos dois discos, de rock psicodélico progressivo, composições minhas em inglês, mas a minha voz me irritava muito. Então, invisto do bolso para mexer nesse arquivo, e lanço virtualmente seis EPs com 18 dessas músicas, com novos vocais, instrumentos, mix e máster. E a honra de ter essas vozes: Mateus Aleluia no EP “Ancient” [posso morrer feliz, pois o mestre gravou três músicas minhas, yeba!], Glauber Guimarães no EP “Ground” [Glauber também criou as capas dos EPs], Nancy Viégas no EP “Wide”, Mauro Pithon no EP “Balance”, Teago Oliveira no EP “Crowd” e Rodrigo Pinheiro no EP “Unquiet”.

As vozes dos EPs The Orange Poem

De janeiro [dez/2013, na real] a outubro de 2014, a dedicação é imensa. Faço a produção musical e executiva, financeiro, assessoria de imprensa e os lançamentos, até culminar no disco duplo “Hybrid”. Uma grana da porra, muito tempo investido, e nenhum retorno financeiro [o de público, só ao longo dos anos, por conta de Mateus Aleluia — o EP “Ancient” que ele gravou, tem mais de 90 mil views no boca a boca em set/2020 — e Ildegardo Rosa — a faixa “Illusion’s Wanderer”, com os seus poemas em português e voz sertaneja, tem mais de 180 mil views no boca a boca em set/2020], só uma imensa satisfação de dever cumprido. Que orgulho!

E a literatura? Não vou retomar o romance “Muralha — O goleiro que nunca tomou gol”? Prioridades: há uma fila em 2014. Livre do fator notícia Copa do Mundo, o romance teria de esperar a conclusão dos trabalhos com o livro de poemas “Nostalgia da lama” e o de contos [“Pinaúna” até 15/12/13, “Paranoia umbigo” até 28/05/14, quando rebatizo para o definitivo “O grito do mar na noite”]. O máximo que faço é atualizar a capa do romance, na terça 21/01/14 [com a pintura “A Morte diante da Lua” em alta, enviada pelo artista Nelson Magalhães Filho, que autorizou o uso das suas telas nos meus livros sem custo — um baita presente!].

No lançamento de “Nostalgia da lama” em 31/05/14, foto de Leo Monteiro

Nostalgia da lama” vem fumegando desde o Réveillon 2013-2014 [festejado no home office do apê 703-B, a editar, remodelar e inserir novos poemas na versão final], e me consome de janeiro a junho. Escrevo, crio as telas internas, faço o design da capa [com pintura de Nelson Magalhães Filho], coordeno a editoração de Marco Schommer, contrato gráfica, pago por 100 exemplares de capa dura, acerto a editora Cousa só para não lançar como “edição de autor”, coordeno o processo de publicação, faço a assessoria de imprensa, dou entrevistas [Mosaico, Correio e A Tarde, entre outros], divulgo nas mídias sociais, produzo o lançamento no sábado 31/05/14 na 1ª sede da RV Cultura e Arte, faço o pós-evento, divulgo as fotos do lança e envio livros para escritores conhecidos. Ufa? Tudo para “Nostalgia da lama” ser superado pelo virtual “Quem se habilita a colorir o vazio?” em 2017.

Peraê! Mas não dá tempo para escrever um pouquinho que seja no romance? Quiii... Trampo da Flica rolando desde o começo de 2014 [coordenador geral e membro da curadoria, além de participar da captação e outras funções] + mandando ver no meu acervo, a disponibilizar as músicas no YouTube e SoundCloud, a digitalizar fotos da The Orange Poem, a organizar e a divulgar no blog os meus discos, composições, livros e portfólio de produção cultural.

Botei a obra no blog em 2014

E o dedo coçando para escrever? Direciono o impulso para o lado musical, a criar longas biografias das minhas composições [não fiz de todas porque cansei], entre 18/02 e 11/08/14, publicadas no blog: “Wideness”, “Neither Gods, Nor Devils”, “The Unquietness”, “Homage”, “Last Fly”, “Farewell Song”, “Rain”, “Lost Mails” e “Shining” [repertório The Orange Poem], “O Milagre” e “Antiga Poesia” [repertório solo].

Escreva o romance, rapá! Pfff... Tem mais sonho para ser realizado nesse 2014 workaholic: o audiovisual! De março a junho, toco o primeiro projeto de roteiro, adaptado do mestre Hélio Pólvora, de uma série chamada “Literárias”, com mais dois parceiros/sócios, mas o que seria o embrião da produtora Aláfia Filmes, desanda em agosto [diferenças de estilo e maneira de trabalhar]. Que pena!

No lançamento do livro de contos “O gol esquecido”, do amigo Mayrant Gallo, no mesmo dia do lançamento de “Nostalgia da lama” (31/05/14) 

Em vez de escrever, leio. Um recorde, até então: 59 livros [53 lidos e 06 relidos]. E tome-lhe gastar tempo selecionando trechos [de 29 livros], a copiar e a postar no blog. Vou a vários lançamentos de autores baianos durante o ano, a divulgar os eventos e as obras, fomentando o cenário. Troco o meu romance pelo prazer de ler os romances de Pepetela, os contos de Hélio Pólvora, os ensaios de David Foster Wallace e as crônicas de Nelson Rodrigues, e de reler os contos de Mayrant Gallo e as crônicas de Clarice Lispector.

2014 antissocial: opto por não sair no Carnaval, dispenso o São João, falto o Natal e durmo em casa no Réveillon, de novo [dessa vez, sem trabalhar]. E a Copa do Mundo no BRASIL, que tanto me mobilizou nos trabalhos do romance em 2013? Só pela tevê [vi quase todos os jogos], como se fosse na Sibéria, e não no meu país, na minha cidade de São Salvador. Ao menos, a Flamanha ganhou! [assim como em 1990, torci por eles e vibrei por cada um dos sete gols na CBF]

Última mensagem do meu querido professor André Setaro [o livro a que ele se refere é o “Nostalgia da lama”]

Nenhuma linha sobre o goleiro negro que poderia ter evitado a tragédia do Minerazo. Em compensação, produzo a gravação do single “A Mendiga e Eu” pela banda Quarteto de Cinco, para concorrer no festival da Educadora FM [não foi selecionada]. E a tristeza, para mim, naquela semana do 7 a 1 em julho foi a morte do melhor professor que tive, o grande mestre André Setaro [prefaciou o “Nostalgia da lama”, leia aqui].

A fila dos meus livros só volta a andar no meio de agosto: recomeço os trabalhos na 1ª versão do livro de contos “O grito do mar na noite”. Em nove dias, reescrevo um conto, reviso cinco e escrevo o xodó “Chá de boldo”. Daí, chega setembro, o mês crucial de logística e pré-produção da Flica, e força a minha literatura a parar. Ao menos, dá tempo para criar a capa, com uma pintura de Nelson Magalhães Filho, e acertar os escritores Mayrant Gallo e Márcio Matos para o posfácio e prefácio [que depois vira orelha].

PS: E o coração? 2014 teve revival [fev e mar] e despedida [jul] da cantora Ana Gilli, e um namoro relâmpago-amoroso com a dançarina Camila [ago-set].

Série Anjos sobre o Recôncavo (2008), de Nelson Magalhães Filho. Uso a maior parte da pintura como capa da 1ª versão do livro de contos “O grito do mar na noite” [mas a versão final de 2015 possui outra capa]

REVER EM VEZ DE ESCREVER

03 de outubro de 2014, sexta-feira. Estou no apê 703-B, pilhado pelo trampo da Flica [pela manhã, eu, o sócio Marcus Ferreira e a produtora Edmilia Barros montamos a equipe de produção da 4ª edição]. Ontem, com o lançamento virtual de “Hybrid”, concluíra os trabalhos da The Orange Poem. E o trampo “O grito do mar na noite” só seria retomado na segunda [a fase de revisão editorial por Mayrant Gallo]. A tarde segue de encontro à noite, e eu não tenho mais o que fazer hoje. Happy hour? Descansar? Nada!

Atravesso a fila e retomo o romance “Muralha — O goleiro que nunca tomou gol”! Que beleza! Finalmente vamos criar o Muralha profissional! Kuéin. Nada! A preguiça continua atuando, e eu só tenho fôlego para rever tudo o que produzi em vez de escrever algo novo [o trabalho é todo feito no home office do apê 703-B].

Seguindo a sugestão do escritor Carlos Henrique Schroeder em 2013 [de quase um ano atrás], revejo o primeiro capítulo: parte do cap. IV se torna o novo I [o romance abre com Mudinho jogando no baba na aldeia, mais ação, impacto, com o tema principal “futebol” à frente, para seduzir o leitor]. E sigo o rearranjo: o novo II é a fusão dos antigos I [casal de paulistas/racismo] e II [dominó + info sobre Mudinho]; revejo o III [sobre Mudinho em Caraíva + obra no chalé] e o novo IV [cenas antes do primeiro baba]. Passo a inserir a divisão ▪ ▪ ▪ entre os trechos dos capítulos do romance.

2h e 40min de trampo sem parar, sem jantar, estou exausto. Chega por hoje. 20h, e eu só quero dormir.

2014, o ano em que revi o poema laranja. Rever é viver!

REVER COMO ESCREVER

E o que é “rever”? Reler e modificar pequenas coisas, estrutura e ordem dos parágrafos e capítulos. Ou seja, rever também é escrever, inserir novos trechos, que sejam mais adequados e coerentes à obra. Porém, na manhã do sábado 04/10/14, tenho um momento de criação pura, e escrevo um novo parágrafo para iniciar o cap. I [o original do pensamento “a Bahia, feminina, não é mãe, é pai, o canalha que faz, mas não cria” de Sanfilippo em Caraíva], que reflete sobre os baianos e afirma que a Bahia tão mulher é um pai ausente. Em “homenagem” ao maestro Letieres Leite, abro o romance assim: “O samba nasceu na Bahia”. Sinto que preciso explicar aos não-baianos o que é um “baba” e insiro também: “Baiano não joga pelada ou racha. Bate o baba — no masculino, mermo.”


Revejo, de novo, os capítulos I ao IV [transformo as falas: de “” em texto corrido para — em parágrafos; insiro o xodó “Um Apolo baiano, apolíneo nagô”, o original do texto de Sanfilippo: “Um olímpico baiano, apolíneo nagô”] e revejo o V [Mudinho sai de Caraíva e passado da sua mãe]. Ao rever o cap. VI [Mudinho em Bom Jesus da Lapa e convite para jogar em Porto Seguro], insiro, pela 1ª vez nessa jornada [no dia em que a expedição portuguesa encontrou o rio que margeia a cidade lapense], a premissa “filosófica” do romance: “Mudinho zerou José Santos. Fixo no presente, ontem é hoje, amanhã é hoje, um jovem sem passado e herança, ficou pronto a responder à vida somente pela razão” — alguns capítulos seguem abaixo, sem vergonha de expor as deficiências [sem revisão]:


MUSIQUINHA

06 de novembro de 2011, manhã de domingo. Muito triste com a situação do meu pai Ildegardo Rosa [internado por conta de um acidente, viria a falecer em dezembro], busco refúgio no violão. De repente, surge uma melodia bem simplesinha. Começo a compor uma baladinha triste, alguém que dispensa o outro, termina uma relação [nada a ver com o que estava vivendo ou sentindo; solteiro, não houve musa]. Nomeio de “Musiquinha”, anoto no caderno e não a concluo — saio com a irmã Kátia Moema (Tita) para visitar o meu pai no hospital.

Outro domingo, 16 de setembro de 2012. Mexendo nos meus arquivos, acabo encontrando o papel com a “Musiquinha” incompleta. Final de tarde/começo da noite, finalizo a composição, gravo-a num vídeo de celular [voz e violão], e a subo no YouTube. Pronto, é o único registro. Nenhum projeto que tive a aproveitou. E o que ela tem a ver com o romance?

“Musiquinha” voz e violão em 2012

O refrão: “Ontem é hoje/ Amanhã é hoje/ Tudo o que nos forma é hoje/ E hoje você não faz mais parte de mim/ Acabou, é o fim”. Foi daí que tirei a premissa “filosófica” de “oroboro baobá”, e que comecei a inserir na jornada no dia de São Francisco de Assis, dois anos depois [não me lembro em qual dos anos escrevi o refrão, mas desconfio que tenha sido em 2011, um presente do subconsciente, inspirado pelo filósofo e poeta que se despedia da matéria].

Cifra de “Musiquinha” com a minha letra

De volta à manhã do sábado 04/10/14, edito o cap. VII, transformando-o em dois: o novo VII [apresentação de Mudinho ao elenco; treinos com o preparador; o goleiro assiste a uma partida do banco] e o novo VIII [Mudinho circula pela cidade, isola-se na pensão, Bip-bip cobra, Xandão faz birra e etc.]. Altero a numeração dos cap. para um a mais, e revejo o novo IX [as duas partidas de Porto Seguro contra Santa Luz].

Andréia Gallo (1967-2015) e Mayrant prestigiam o lançamento de “Nostalgia da lama” em 31/05/14. Foto: Léo Monteiro

PRESENTES DE MAYRANT GALLO

Segunda, 06 de outubro de 2014, manhã. No escritório de Mayrant Gallo [o autor baiano predileto; ao ler o seu livro de contos “Pés quentes nas noites frias”, pensei: “quero escrever assim”] em frente à Praça da Piedade, centro de Salvador, começamos o processo de revisão editorial de “O grito do mar na noite” [um serviço que contratei do amigo, que cobrou um preço camarada].

Trabalhando por quase quatro horas sem parar, revisamos os contos “Chá de boldo”, “Aqui se paga” e “Não escaparás”. E uma revolução acontece em mim. O professor Mayrant me faz compreender como enxergar o texto, captar as suas nuances, encontrar os seus defeitos. Na real, um aulão de como ser um editor.

Duas da tarde, e vamos juntos almoçar. Na praça de alimentação do Center Lapa, entre vários outros assuntos, conversamos sobre “Muralha — O goleiro que nunca tomou gol”, inclusive as partes que faltam ser escritas. Mayrant Gallo oferece o seu presente ao romance: aconselha-me a evitar vínculos com clubes de futebol. Argumenta com precisão, e o meu HD guarda para avaliar melhor. Na real, sei que ele tem razão, mas ainda não quero mudar.

Apê 703-B. Noite. Deito na cama. Estou satisfeito! Que sensação de liberdade! Finalmente valorizo a minha literatura e afirmo: eu sou escritor! Estou em paz. E voraz para investir nessa carreira.

PS: Ao todo, foram sete sessões [entre 06 e 15/10/14] com Mayrant Gallo, sete contos revisados, e um aprendizado para a vida toda [qualifiquei-me para fazer revisões editoriais também], um dos melhores presentes que já recebi.

Aos 34 anos em 07/10/14

ROMANCE NO NIVER [1ª VEZ]

Na terça, 07 de outubro de 2014, estreio nos 34 anos. Resolvo trampar pela Flica só de manhã, para me dar o presente de trabalhar no meu 1º romance pela tarde. Revejo o novo X [família de Seu Brito e Sanfilippo; troco Rainbow Gathering por nômades, para não fazer propaganda], o novo XI [Mudinho na delegacia de Santa Luz; insiro novos diálogos] e o novo XII [1ª partida da final; Marceleza morre].

Analisando o cap. XII original, decido separar o enterro de Marceleza & acertos Xandão com prefeito da finalíssima do Amadô, dando mais destaque individual às cenas, importantes para o romance. Assim, altero a numeração dos cap. para um a mais [de novo] e escrevo um parágrafo para o novo XIII, detalhando a despedida do artilheiro: “O funeral foi épico, de herói: cortejo choroso, lento, sofrido pelas ruas de Porto Seguro. Uma multidão acompanhou o caminhão dos Bombeiros” [presença dos fãs, jogadores, trabalhadores legais e ilegais, políticos, etc.].

Por fim, antes de postar a foto e poemico “34” no Facebook, revejo o novo XIV [Porto Seguro campeão na finalíssima] e o novo XV [reflexões sobre Mudinho + Seu Brito na pensão para contratá-lo].

Muralha, com a minha letra

NOVO TÍTULO [1ª VEZ]

Tarde do sábado 11/10/14, de rolé nas livrarias de um shopping, a folhear livros de atrações da Flica 2014, penso no romance [a parte escrita e a escrever] e decido por mudanças — a única 100% registrada: modifico título de “Muralha — O goleiro que nunca tomou gol” para “Muralha” [quis sintetizar, dizer o mais importante, melhorar para a divulgação e design da capa].

A seguir, por três dias [14, 18 e 19/10/14], invisto quase oito horas para rever os capítulos I a IX, e incorporar essas mudanças e melhorias.

Yakutsk, uma das cidades mais frias do mundo (temperatura média anual de -21°C), presente no capítulo descartado. Foto: Svetlana Ivanova

VAZA FAMÍLIA BRITO

Quarta, 22 de outubro de 2014, manhã. Com saudade do meu pai [seria aniversário dele hoje, último dia de libra], publico no blog “Ildegardo Rosa, o andarilho da ilusão”, divulgando a faixa “Illusion’s Wanderer” e trechos dos seus poemas. Trabalho pela Flica e, antes do almoço, melhoro o final do cap. IX [Xandão decide ir embora de Santa Luz sem Mudinho].

Tarde. Libero-me do trampo Flica para focar no romance. Recupero a sugestão do escritor Aurélio Schommer em 2013 [de mais de um ano atrás], de enxugar a família do personagem Seu Brito, mas prefiro radicalizar: descarto todo o cap. X [arquivei-o como “Muralha — Capítulo 10 original”]. Então, altero a numeração dos cap. para um a menos, revejo dos novos X ao XIV [arquivo também um trechinho da família como “Muralha — Sobra do capítulo XII (2013)”], insiro Sanfilippo a partir da confusão em Santa Luz, e Seu Brito apenas na finalíssima [“Próximo ao Natal, a numerosa e rica família Brito estava reunida na mansão de veraneio na paradisíaca Trancoso. Para ostentar o sucesso do time que dirigia, Sanfilippo levou o pai e o irmão à final do Amadô. Durante o caminho até a Toca do Guaiamum, contou sobre o goleiro calado, que não tomava gol de jeito nenhum”].

O capítulo e o trecho descartados seguem abaixo, sem vergonha de expor as deficiências [sem revisão]:


OROBORO BAOBÁ [3ª VERSÃO]

Sexta, 24 de outubro de 2014, manhã. Faço pequenos ajustes em alguns trechos, reviso a contabilidade do trabalho no romance, elaboro e publico no blog “Na produção do livro Muralha: Parte I — ok”, a 1ª vez que anuncio o término do trabalho, mesmo sendo apenas uma parte dele [que pressa...]. “Desvinculei Muralha das Olimpíadas de 2012 e da Copa do Mundo de 2014 e ainda não defini o rumo que tomarei” resume bem a situação.


“Aláfia! O trabalho, prazeroso e doloroso, segue”. E segue mesmo. Depois do trampo pela Flica, das 16h às 19h dessa sexta, analiso várias possibilidades, escolho um caminho, e crio um novo argumento para a 2ª parte do romance [descarto o argumento de 2013] — segue abaixo, sem vergonha de expor as deficiências:


A principal mudança é a aposta numa manjadíssima rivalidade entre pai e filho para a próxima parte do romance [além de retomar o Flamengo como destino de Muralha em vez do Corinthians — coração rubro-negro falou mais forte]. Seu Brito e Sanfilippo passam a ser mais importantes, e eu preciso fazer uns ajustes gerais na “Parte I — Mudinho 2010” para dar mais coerência ao que pretendo escrever.

No sábado 25/10/14, antes de ir para a festança de aniversário da amiga Raquel Pimentel [com direito a show do fodástico Eric Assmar & banda num playground, a festa mais divertida do ano], véspera das eleições “perdeu playboy” e da imersão na Flica 2014, realizo essas adequações [modifico o nome do tricolor, de “Esquadrão de Aço” para “Baêa”, e escrevo o original do xodó “Como a maioria dos torcedores do tricolor baiano, o rapaz berra o urro primal da sua tribo, sem motivo para tanto — é capaz de ver o caixão do pai descer na cova e gritar: ‘Bora, Baêêêêa!’”].


Então, considero concluída a 1ª parte do romance “Muralha” hoje, um dia após postar o anúncio fail no blog [inauguro aí o vexame recorrente de mexer em originais “terminados”].

Com a equipe de produção da Flica 2014, nos bons tempos em que eu coordenava esse povo lindo!

O ROMANCE VIRA CONTO

Após coordenar a realização da 4ª edição da Flica [que, por causa das eleições, terminou em 02 de novembro, excepcionalmente], retomo os trabalhos com a 1ª versão do livro “O grito do mar na noite” até enviá-lo, na quarta 12/11/14, para a mesma gráfica que imprimiu “Nostalgia da lama” [também seria uma tiragem de capa dura, com design semelhante, saindo com a marca da Cousa — tudo financiado e coordenado por mim — e pintura de Nelson Magalhães Filho, só que a empresa enviou uma boneca cheia de defeito e recusou o pedido; não consegui outra gráfica com preço acessível e desisti da capa dura, adiando o lançamento].

O pós da Flica 2014 deu uma sossegada... bora retomar o romance? Nada! Antes, quero viver um romance com Lorena, a bela morena que fiquei na festa de Raquel [e que passou comigo o final de semana da Flica em Cachoeira]. Pfff... Querer não é poder. A gata me dá um zig total, some e me deixa no vácuo: fico numa fossa daquelas em pleno feriado da República. Resultado: acordo PUTO no domingo 16/11/14. Drástico, decido: “Desisto de ser romancista. Eu sou contista!”.

Já sentia zero estímulo para continuar a escrever o romance [since 2013], e tava num embalo bom como contista [afirmei “eu sou escritor” graças aos contos]: só vejo vantagem em continuar nessa, até porque a 1ª parte do romance tá pronta e é só requalificá-la como um conto. Simprão, né? A raiva do zig me serve de sacode poeira e eu crio um novo projeto de livro, a ser lançado na sequência do grito. Basta 10 minutos para transformar “Muralha” em conto.

A 3ª sugestão para a capa do romance [então um conto do livro “Paisagem da insônia”]: fragmento da pintura “A Morte diante da Lua” (1998), de Nelson Magalhães Filho

CAPA [3ª VEZ]

Domingo, 16 de novembro de 2014, manhã. Se “Muralha” agora é conto, preciso de capa nova. Assim, crio a bendita para o livro “Paisagem da insônia” [“Muralha”, o 1º conto incluído nesse original], a partir de um fragmento da pintura “A Morte diante da Lua”, de Nelson Magalhães Filho [utilizada por completo na 2ª versão da capa em dez/13].

PS: Extraí o título da frase “Brasília é paisagem da insônia”, presente na crônica “Nos primeiros começos de Brasília” (20/06/1970), da mestra Clarice Lispector, publicada no livraço “A descoberta do mundo” [o que eu mais gosto dela], que tive o prazer de reler entre junho e setembro de 2014.

Clarice Lispector descreve a capital federal como “paisagem da insônia” numa crônica de 1970

LITERATURA EM ALTA

Paisagem da insônia” toma a dianteira da fila: refaço e insiro no original quatro contos [entre eles, o xodó “Bonecas”]. Daí, nova pausa para arrumar o conteúdo do site Mirdad + pós da Flica [enquanto lia o excelente livro de ensaios “O demônio do meio-dia — Uma anatomia da depressão”, de Andrew Solomon, voltava a nadar em vez de malhar (20 anos depois, de volta ao Asbac) e curtia um affair de 20 dias com a corretora Mariana].

Depois do belo feriado de oito de dezembro, retomo “Paisagem da insônia”: decido homenagear o mestre Ruy Espinheira Filho no livro, assim como fiz com Hélio Pólvora em “O grito do mar na noite”, e escrevo os xodós “Sol de abril” [12, 14 e 15/12; uma homenagem à canção “Assum Preto” e à herança sertaneja do meu pai sergipano] e “O banquete” [15 a 18/12]. PS: A literatura pulsava tanto que até pensei numa coleção de cinco livros de contos — o próximo seria em homenagem a Mayrant Gallo [o que se concretizaria em “Olhos abertos no escuro”].

Após ler quinze peças curtas do romeno Matéi Visniec [levei-o para a Flica 2014, uma dica de Mayrant], reunidas no livro “Cuidado com as velhinhas carentes e solitárias”, e vivenciar a emocionante cerimônia de espalhar as cinzas do meu pai na Baía de Todos os Santos, com a Igreja do Bonfim ao longe [o poeta queria ser vento, e não pedra; ao assoprá-lo, realizei a sua vontade], começo a reler os livros do amigo Mayrant [acertei com ele a revisão editorial de “Paisagem da insônia”].

Ildegardo Rosa (1931-2011)

MURALHA NO CÉU

Na noite da quinta 25/12/14, penso: se o livro tem como homenageado o poeta baiano Ruy Espinheira Filho assim como Hélio no grito, porque o título reverencia Clarice Lispector? Vixe! Vaza o belo “Paisagem da insônia” direto para o túmulo dos arquivos. Rebatizo o livro [que tem o conto “Muralha” como destaque] para “O céu de sombras ao vento”, um anagrama com títulos de livros de Ruy.

Sexta, 26 de dezembro de 2014, manhã. Eu e Mayrant Gallo iniciamos o processo de revisão editorial do livro de contos “O céu de sombras ao vento” [sempre com ele via Skype, e eu no apê 703-B]. Escolho o melhor e mais importante conto para começar: “Muralha”. Revisamos o cap. I em duas horas.

A 4ª sugestão para a capa do romance [então um conto do livro “O céu de sombras ao vento”]: pintura da Série Anjos Baldios (2004-2006), de Nelson Magalhães Filho

CAPA [4ª VEZ]

Quinta, 25 de dezembro de 2014, noite. Após decidir pelo título “O céu de sombras ao vento”, resolvo trocar a capa. Avalio a figura da pintura “A Morte diante da Lua” como muito frágil para representar Muralha. Troco para uma outra, creditada como “Série Anjos Baldios (2004-2006)”, talvez a minha predileta de Nelson Magalhães Filho, em que a figura humana [formada por “montanhas”] tem a altivez e a força que busco para o meu personagem.

Graças ao trabalho do radialista e repórter fotográfico Geovan Santos, o “Ligeirinho”, que pude me informar sobre a seleção de Porto Seguro, para poder ter base para criar a minha seleção. O personagem Bip-bip é uma homenagem ao Ligeirinho no Esporte.

BIP-BIP BATIZA MURALHA

Sábado, 27 de dezembro de 2014, a última criação do ano, no home office do apê 703-B. Reflito: se a “Parte I — Mudinho 2010” é a totalidade do conto “Muralha”, preciso rever a presença do título na história; não dá mais para aparecer apenas no final. Acho coerente e insiro o nome “Muralha” mais cedo [dou uma geral em vários capítulos]. Não é mais Seu Brito quem batiza Mudinho. É o jornalista Bip-bip [nessa época, endossado pelo preparador de goleiros, e não por mando do artilheiro]:

“(...) Bip-bip, safo no marketing, avaliou que, enquanto personagem, era melhor para o goleiro imbatível uma alcunha imponente, à altura de seu talento. Mudinho era apelido de pixote, não representava o talento e, pior, não rendia cliques. A manchete consagrou: ‘Porto Seguro merece o goleiro Muralha’. (...) – Muralha? Taí, gostei! Ô, Mudinho, teu nome agora é Muralha, viu?! (...) No meio do treinamento, Ferreira repercutiu o artigo com o batismo certeiro de Bip-bip. Achou coerente: o apelido Mudinho não tinha nada a ver com a muralha negra, imensa, impenetrável. O rapaz, indiferente, continuou a defender. Lupino torceu o nariz.”

A saideira de 2014 acontece na tarde da segunda 29/12. Em pouco mais de duas horas, eu e Mayrant revisamos os capítulos II e III. Para concluir a revisão do conto “Muralha”, só ‘paroano’.

Na abertura da Flica 2014. Foto: Egi Santana

AGRADECIMENTOS 2014

Agradeço aos amigos Aurélio Schommer, Carlos Henrique Schroeder, Darino Sena, Mayrant Gallo, Ivan Dias Marques, Ana Gilli, Gustavo Castellucci, Tom Correia, entre tantos outros, que me deram dicas valiosas.

Dos livros lidos e relidos [durante o processo de escrita e fora dos dias de trabalho no romance] em 2014, são estes acima os que eu considero como os mais importantes para a minha formação como leitor e escritor

CONTABILIDADE 2014

Em 2014, invisto 35 horas e 20 minutos em 14 dias [nos meses de outubro, novembro e dezembro] para escrever “oroboro baobá”.

3ª fase
29h e 10min | 10 dias
Outubro de 2014
[Romance “Muralha — O goleiro que nunca tomou gol” — 1ª parte]
[Romance “Muralha” — 1ª parte]

4ª fase
06h e 10min | 04 dias
Novembro e Dezembro de 2014
(Conto “Muralha”]

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Clarice Lispector (foto daqui ) “O outono aqui está muito bonito e o frio já está chegando. Parei uns tempos de trabalhar no livro [‘A maçã no escuro’] mas um dia desses recomeçarei. Tenho a impressão penosa de que me repito em cada livro com a obstinação de quem bate na mesma porta que não quer se abrir. Aliás minha impressão é mais geral ainda: tenho a impressão de que falo muito e que digo sempre as mesmas coisas, com o que eu devo chatear muito os ouvintes que por gentileza e carinho aguentam...” “Alô Fernando [Sabino], estou escrevendo pra você mas também não tenho nada o que dizer. Acho que é assim que pouco a pouco os velhos honestos terminam por não dizer nada. Mas o engraçado é que não tendo absolutamente nada o que dizer, dá uma vontade enorme de dizer. O quê? (...) E assim é que, por não ter absolutamente nada o que dizer, até livro já escrevi, e você também. Até que a dignidade do silêncio venha, o que é frase muito bonitinha e me emociona civicamente.”  “(...) O dinheiro s

Oito passagens de Conceição Evaristo no livro de contos Olhos d'água

Conceição Evaristo (Foto: Mariana Evaristo) "Tentando se equilibrar sobre a dor e o susto, Salinda contemplou-se no espelho. Sabia que ali encontraria a sua igual, bastava o gesto contemplativo de si mesma. E no lugar da sua face, viu a da outra. Do outro lado, como se verdade fosse, o nítido rosto da amiga surgiu para afirmar a força de um amor entre duas iguais. Mulheres, ambas se pareciam. Altas, negras e com dezenas de dreads a lhes enfeitar a cabeça. Ambas aves fêmeas, ousadas mergulhadoras na própria profundeza. E a cada vez que uma mergulhava na outra, o suave encontro de suas fendas-mulheres engravidava as duas de prazer. E o que parecia pouco, muito se tornava. O que finito era, se eternizava. E um leve e fugaz beijo na face, sombra rasurada de uma asa amarela de borboleta, se tornava uma certeza, uma presença incrustada nos poros da pele e da memória." "Tantos foram os amores na vida de Luamanda, que sempre um chamava mais um. Aconteceu também a paixão

Dez poemas de Carlos Drummond de Andrade no livro A rosa do povo

Consolo na praia Carlos Drummond de Andrade Vamos, não chores... A infância está perdida. A mocidade está perdida. Mas a vida não se perdeu. O primeiro amor passou. O segundo amor passou. O terceiro amor passou. Mas o coração continua. Perdeste o melhor amigo. Não tentaste qualquer viagem. Não possuis casa, navio, terra. Mas tens um cão. Algumas palavras duras, em voz mansa, te golpearam. Nunca, nunca cicatrizam. Mas, e o humour ? A injustiça não se resolve. À sombra do mundo errado murmuraste um protesto tímido. Mas virão outros. Tudo somado, devias precipitar-te — de vez — nas águas. Estás nu na areia, no vento... Dorme, meu filho. -------- Desfile Carlos Drummond de Andrade O rosto no travesseiro, escuto o tempo fluindo no mais completo silêncio. Como remédio entornado em camisa de doente; como dedo na penugem de braço de namorada; como vento no cabelo, fluindo: fiquei mais moço. Já não tenho cicatriz. Vejo-me noutra cidade. Sem mar nem derivativo, o corpo era bem pequeno para tanta