“Você tem que ouvir é rock, seu porra!”. Sábio amigo Alan Freitas. Indignado com minha obsessão pelo reggae, foi praticamente um missionário fundamentalista; insistiu tanto que conseguiu reverter a minha ‘hippiezação’ (nada contra, é claro!). Era 1997, e só um pouco de suas ofertas foram bem aceitas. Recordo que uma das mais rechaçadas foi o tal do Pink Floyd. Absorvido pelo pop punk dos Ramones, eu estava há anos luz da psicodelia.
Mas Alan foi persistente, e percebendo qu’eu tinha um fascínio por solos de guitarra, não tardaria por abismar-me pelo genial David Gilmour. E com a ‘descoberta do mundo’ provocada pelo Led Zeppelin, principalmente por Jimmy Page, a semente do caos estava germinando. Tanto que, no ano seguinte, 1998, já obcecado por ter uma banda, ganhei de presente de meu pai uma Les Paul genérica, da Epiphone, que batizei de ‘Lílian’. Coitada. Sempre foi o entulho de cima de meu armário; nunca tive dedo suficiente para manuseá-la.
Analisando hoje o ponto de partida ‘floydiano’ em minha formação musical, encontro a importância desbravadora do álbum OK Computer, do Radiohead, que junto ao Bringing Down the Horse, do The Wallflowers, foram os dois primeiros discos ‘de rock’ que comprei em minha vida, em 97. O OK, resguardadas as devidas proporções para a ingenuidade da época, me apresentou um pouco do que poderia ser o experimentalismo e as viagens lombrantes das ambiências sonoras etéreas, coisas que o reggae não tinha (a viagem deste é na vibração do corpo, no pulso, não na lisergia da mente), além da melancolia e a sensação de claustro. Ou seja, todos os ingredientes que preciso pra não desistir de respirar.
Então, juntando solos de guitarra + pacote lisérgico melancólico + insistência homeopática de Alan, progressivamente fui compreendendo as nuances complexas do fluido sonoro inglês; de quebra, da nossa existência. E assim curti o Pink Floyd, confortavelmente chapado de som, apenas. Canonizei-os ao lado de Bob Marley, e fundei a banda The Orange Poem sonhando em soar como eles, em 2001, aos 20 anos.
Enquanto quase todos são The Beatles, outros são The Rolling Stones, eu sou da turma dos progressivos quase unicamente floydianos (outra banda no estilo? - difícil ouvir!), parido pelo Led Zeppelin, imerso na psicodelia pra sempre. Tenho quase todos os discos, e os guardo nos plásticos ainda, dentro de uma caixa, no armário. Para ouvi-los, é uma solenidade.
Comfortably Numb foi lançada no insuperável álbum/espetáculo/filme The Wall, quase 30 anos atrás, em 1979 (nov/dez). Na humilde opinião deste blogueiro aqui, é a mais bela e maior canção do Pink Floyd (com Echos em 2º lugar, beirando), e foi a que a The Orange Poem tocou sempre que pode, com Fábio e Jesus dialogando fielmente ao reproduzirem os belíssimos solos de Gilmour (por sinal, deveriam ser considerados patrimônio cultural da humanidade). Por sinal, o solo da gravação original também está arquivado em minha memória afetiva (nem venham dar nota errada qu’eu irei apontar!). A curiosidade é que sempre foi a música mais aplaudida dos nossos shows. Não dá pra reproduzir aqui o enorme prazer em cantar: “O.K. Just a little pin prick, there'll be no more” e depois sacar um agudaço grito espeto “aaaaaaaah!”. Foda! Saudades...
Segue abaixo a versão do Live 8, o último (mesmo) momento do Pink Floyd em ação, em 2005, três anos antes do imortal Richard Wright morrer (foto). Emoção insolúvel. Muito obrigado, seus sacanas!
Comfortably Numb
(Roger Waters / David Gilmour)
Hello,
Is there anybody in there?
Just nod if you can hear me
Is there anyone at home?
Come on now
I hear you're feeling down
I can ease your pain
And get you on your feet again
Relax
I'll need some information first
Just the basic facts
Can you show me where it hurts
There is no pain, you are receding
A distant ship smoke on the horizon
You are only coming through in waves
Your lips move but I can't hear what you're saying
When I was a child I had a fever
My hands felt just like two balloons
Now I've got that feeling once again
I can't explain, you would not understand
This is not how I am
I have become comfortably numb
O.K.
Just a little pin prick
There'll be no more...aaaaaaaah!
But you may feel a little sick
Can you stand up?
I do belive it's working, good
That'll keep you going through the show
Come on it's time to go.
There is no pain you are receding
A distant ships smoke on the horizon
You are only coming through in waves
Your lips move but I can't hear what you're saying
When I was a child
I caught a fleeting glimpse
Out of the corner of my eye
I turned to look but it was gone
I cannot put my finger on it now
The child is grown
The dream is gone
And I have become
Comfortably numb.
.
Comentários
Isso foi em 1998, quando prestei meu primeiro vestibular (3o ano no extinto PhD), e eu me lembro que consegui driblar um fiscal, fazendo uma prova de redação inteira ouvindo essa bendita fita.
Comfortably Numb estava lá, era a preferida, e embalou minha sonora nota 10, grande destaque do ano.
Desse disco, a melhor música, com certeza !
Mas eu sou apaixonado pelo Animals - Dogs e por Echoes.
E seu Zano, deixe de chiada, vc tocava a porra igualzinha!
Com certeza no meu ranking depois de CN vem Echoes e Dogs. E o Animals é muito foda!
Abraço!
Salvar sua alma, ministrando doses precisas de Pink Floyd, na verdade, foi uma tarefa fácil.
Modéstia à parte, eu já sabia que iria conseguir. Era perceptível que você, assim como eu, repirava Pink Floyd, e, pelo visto, continua respirando. Os acordes da sua viola me diziam isso.
Aproveitando o ensejo:
"Breathe, breathe in the air
Don't be afraid to care"
Forte abraço.
Parabéns pelo blog.
Alan