Nicolas Behr - Foto: Divulgação
“minha poesia sabe que todas as verdades são falsas”
“minha poesia se torna presente na ausência”
“minha poesia corre pro abraço, cai, quebra a cara”
“minha poesia é explosão vulcânica pra dentro”
“minha poesia é a casca tatuando o corpo da árvore”
“minha poesia perde as folhas e aí dá sombra”
“minha poesia fala através das próprias ruínas”
“minha poesia já foi longe demais. melhor voltar”
“minha poesia decreta: amai-vos uns aos outros
e o resto que se foda”
“minha poesia têm um papel higiênico a cumprir”
“minha poesia é uma palavra que resolveu ter cor”
“minha poesia faz com os pés o autoexame dos seios”
“minha poesia tem estilo. o problema são as moscas”
“minha poesia é colagem, miragem, ilusão, efeito”
“minha poesia seca as mãos com água, limpa as
mãos com terra, corta as mãos com agulha”
“minha poesia admira a paisagem dos elevadores”
“minha poesia são palavras frias que são flores secas
que são frutos podres que são árvores mortas”
“minha poesia é como fumaça. sufoca mas passa”
“minha poesia tem horror ao vácuo”
“minha poesia é um caco de vidro no seu olho”
“minha poesia sem olfato e paladar não faz sentido”
“minha poesia cumpre sua palavra
e muda o nome das coisas. mesa agora é tijolo”
“minha poesia hoje não tem nenhum compromisso
agendado com a realidade. amanhã também não”
Nicolas Behr - Foto Truman Macedo
“minha poesia é a voz que começa na garganta
e termina aqui”
“minha poesia é o free jazz da literatura”
“minha poesia com o dedo no gatilho
é muito mais rápida que a morte”
“minha poesia é iconoclasta mas isso não basta”
“minha poesia se serve pra jogar fora
então serve pra poesia”
“minha poesia é como um corpo que nasce, cresce,
morre, esfria, endurece, desidrata e apodrece”
“minha poesia está a um passo da loucura ou
a um passo de um novo poema?”
“minha poesia desata os nós dos bambus”
“minha poesia entra em cena e fica só no aplauso”
“minha poesia não é feliz mas tem quem a leia”
“minha poesia é saída honrosa, morte digna”
“minha poesia é estímulo que faz o suicida viver”
“minha poesia saiu no meio do sarau poético.
chatice tem limite”
“minha poesia é mestre em literatura pela
faculdade das letras apagadas e ciências ocultas”
“minha poesia não passa de um passatempo”
“minha poesia é murro em ponta de faca”
“minha poesia pede desculpas só pra te agradar”
“minha poesia é apenas uma tentativa de
te ludibriar. parece que está conseguindo”
“minha poesia cria uma nova
forma fixa de poesia: a zorra total”
“minha poesia olhou pra plateia da faculdade mas
só viu seios. pra que tantos seios? dois bastam”
“minha poesia, em grego, defeca odes de mármore”
“minha poesia é esgoto sagrado na água benta”
“minha poesia não tem mais nada a dizer mas
mesmo assim vai dizer o que não tem a dizer”
Versos presentes no livro-poema Umbigo (LGE Editora, 2005), de Nicolas Behr, páginas 42 a 51.
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